Tokaji: o Rei dos Vinhos, por Eduardo Araújo
No Nordeste da Hungria, onde os rios Tisza e Bodrog desenham as montanhas e suas colinas vulcânicas, nasce o Tokaji (pronuncie “Tocai”, o vinho doce que apesar da sombra do seu irmão distante, Sauternes, conquistou reis, inspirou o hino nacional e criou uma história rica e importante.
A viticultura em Tokaj-Hegyalja remonta aos séculos XVI e XVII sob o Império Otomano, quando monges e camponeses aproveitavam esse terroir especial para produzir seus vinhos. A lenda conta que, por volta de 1650, fugindo de invasores turcos, a colheita foi adiada e quando os locais voltaram as uvas estavam cobertas por um fungo, ressecadas e com uma aparência horrível. Como essas uvas eram tudo que tinham decidiram fermentá-las mesmo assim. O resultado foi um néctar doce e complexo que nobres e camponeses amaram.
Mas, a lenda é sempre uma das histórias e registros locais encontraram leis e regulamentações sobre a produção de vinhos com uvas Aszú (com a presença do fungo da podridão nobre) desde 1570 e a produção de vinhos assim desde 1517. Para comparação, os famoso TBA Alemães e os Sauternes bordaleses só apareceram no final do século XVIII. Os Húngaros ainda clamam serem os primeiros a delimitar uma região vinícola geograficamente em 1737 com um decreto do Imperador Carlos VI.
Outro fator único dessa região é a famosa uva local, a Furmint, com características perfeitas para esse estilo de vinho, com casca grossa, acidez alta e um ciclo de maturação demorado. Além é claro das outras locais que hoje compõe o blend: a Hárslevelű e a Moscatel.
Conta outro registro que o príncipe transilvano Ferenc Rákóczi II presenteou Luís XIV da França com uma garrafa de Tokaji Aszú. O Rei Sol, extasiado, proclamou: "O vinho dos reis, o rei dos vinhos!". Outras cortes europeias foram apresentadas ao Tokaji e até mesmo alguns pagamentos eram feitos com suas barricas, cheias é claro. O vinho simbolizava luxo e longevidade.
A umidade dos banhados formados pelo rio e a bruma outonal formam um paraíso para a formação do fungo botrytis cinerea, esse fungo concentra as uvas, mantendo alto nível de açúcar e acidez natural. O vinho tradicionalmente era feito com a colheita minuciosa, por mulheres, somente dos bagos atacados pelo fungo, um trabalho que exigia diversas passagens pelas mesmas parcelas. Essas uvas eram colocadas em cestos de 25kg chamados puttony e os vinhos eram classificados de acordo com o número de puttonyos adicionados ao vinho base seco em pequenas barricas de 136 litros chamadas Gönci, de 3 a 6 puttonyos. Há muito tempo esse método se tornou apenas ilustrativo, sendo o residual de açúcar por litro o amplamente utilizado. Desde 2013 a lei permite apenas 5 e 6 puttonyos com 120 e 150 gramas de açúcar mínimo respectivamente. Os vinhos ainda passam cerca de 2 a 3 anos amadurecendo em barricas de carvalho.
Existe um raríssimo néctar chamado Tokaji Eszencia que é a pura gota das uvas aszú que escorrem e são fermentados, mas, com muita dificuldade pois as leveduras não aguentam tanta concentração de açúcar, essas fermentações podem durar até 4 anos e o vinho raramente passa de 5% de álcool, mantendo mais de 500 gramas de açúcar residual, chegando a mais de 800g em algumas safras. Esses vinhos são tão densos e concentrados que são servidos em colheres.
O que torna Tokaji ainda mais especial é seu equilíbrio entre doçura e acidez deixando esses vinhos absurdamente longevos podendo durar muitas décadas.
Além desse néctar a região está se especializando ainda mais em brancos secos, principalmente com a Furmint, que valem muito a pena provar.
E para harmonizar os Tokaji doces vão especialmente bem com foie gras, queijos azuis e sobremesas cítricas.
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Sobre o autor
Eduardo Machado Araujo
Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers
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