Travessia do Atlântico: Manezinhos revelam desafios da jornada
Marcelo Gusmão e Daniel Gomes explicam como enfrentaram tempestades, ondas e ciclones na longa travessia
ENTREVISTA - PARTE 2
Depois de enfrentar ventos fortes, ondas enormes e dias de alerta constante, a travessia do veleiro Moleque segue revelando os desafios e aprendizados da vida no mar. Na segunda parte da entrevista, Marcelo Gusmão e Daniel Gomes falam sobre os tipos de velejadores que se encontram pelo Atlântico, o papel da tecnologia e da experiência na navegação, momentos críticos enfrentados durante tempestades, a rotina de turnos e cuidados a bordo, e a emoção de avistar o arquipélago dos Açores. Eles também compartilham superstições do homem do mar e os próximos passos da jornada, incluindo a ambição de explorar o Mediterrâneo nos anos seguintes.
Imagem da Ilha: Que tipo de velejador você encontra nessa travessia?
Gusmão: Você encontra todo tipo de gente. Todo tipo de barco, todo tipo de orçamento. É impressionante! Conhecemos uma família que só tem o barco. Marido, mulher, dois filhos... Eu pergunto: “o que mais tu tem?" "Só tenho o barco". Insisto: Como é que vive? "Faço um charter aqui, outro ali, faço um trabalho local, minha mulher trabalha um pouco..." e assim eles vão sobrevivendo. Vão vivendo a vida embarcados pelo mundo. Se a temporada é boa nos Açores, então é pra lá que vão. Velejando tem custo baixo, o vento “não custa nada”, (risos).
Chegam nos lugares e correm atrás de todo tipo de trabalho. Ele trabalha, ela trabalha, às vezes fazem um charter e assim segue, enquanto as crianças estudam no sistema de ensino a distância.
Imagem da Ilha: Mas para navegação, o que é imprescindível mesmo é a internet? Certo?
Gusmão: Eu sou um velejador que velejei sem toda essa tecnologia de hoje. Viajava só na bússola. Utilizava a localização das estrelas e navegação estimada para traçar a rota. Quando via uma referência em terra, já sabia onde estava. Hoje em dia, a gente tem todos os equipamentos possíveis e imagináveis. Tem até internet a bordo. Então, o que é fundamental para você sair? É você ter um bom barco, com vontade de viver a bordo. Aí você já pode sair.
Imagem da Ilha: Quantos pés tem o barco Moleque?
Gusmão: O Moleque tem 13 metros, que são 43 pés, e está super equipado e completo, com muitos equipamentos de segurança: balsa salva-vidas, localizadores, inclusive um com SOS em nível mundial para socorro. Uma questão importante a bordo é a energia. Você precisa de energia para quase tudo que tem no barco. Então cada aparelho utiliza uma quantidade de energia específica. Você vai monitorando isso o tempo todo através de um painel. Mas quando você começa a ter muita tecnologia no barco, você "cria” outro problema. O problema de cuidar daquilo ali funcionando, porque tudo consome energia. É a mesma coisa com o celular hoje. É quase impossível ficar sem o celular. Se tu perde o celular hoje, tu vai correndo comprar outro. Ninguém fica 24h sem celular. Então, é a mesma coisa nos aparelhos do barco. Tudo realmente traz conforto e segurança. Hoje não existe barco sem GPS, uma tecnologia praticamente “de graça”. Quando estamos no meio no oceano, usamos a Starlink, daqui a pouco a tecnologia vai evoluir ainda mais.

O barco Moleque em um momento de repouso.
Imagem da Ilha: Nessa travessia ali do Alto Caribe para os Açores, qual foi o momento mais crítico?
Gusmão: Acho que não houve nenhum momento de pânico, nem momento de desespero. O que houve foram momentos de muito vento e muito mar. Eu sempre procuro enfatizar que o que recebemos dos sites e aplicativos, é uma “Previsão”, e as previsões podem ser diferentes “na prática”. Numa das previsões, o vento previsto era de 35 nós (65 Km/h), e ele chegou a 50 (92,6 Km/h) nós. Por vários motivos, ele mudou de intensidade!!! Fazer o que, já estávamos ali. E quando você tem um vento de 50 nós, consequentemente formam-se ondas grandes ao longo de 24h, e a situação fica preocupante com ondas de 6 a 7 m de altura. Aí o ambiente a bordo fica muito tenso, com tudo muito molhado, a preocupação com a segurança “tresdobra”... Sorte que temos um barco extremamente seguro. Fui eu que construí, então eu sei exatamente o que tínhamos.
O limite de segurança do Moleque vai muito além de tudo aquilo que pegamos, mas sempre há um limite para o material. Teve um momento muito tenso na travessia, acho que foi pelo 9º dia, certo, Daniel? Nós resolvemos ir mais para o Sul, seguindo um pouco mais em linha reta e o ciclone nos pegou vindo do sul. Andamos umas 10h de storm jib (vela de temporal). Depois de 10h, resolvemos sair fora do ciclone, “arribando” 90 graus.
Daniel: Só para se ter uma ideia, o barco operando com o motor pode chegar a uma velocidade de 5 nós (9,2 Km/h), em mar lisinho, ele chega a 6 nós (11,1 Km/h). No ciclone, só com uma pequena parte da vela içada, chegamos à velocidade de 11 a 12 nós (22,2 Km/h).
Gusmão: Então, ao todo passamos estes dois dias no ciclone, e umas 12 horas com ventos a 50 nós. Vento muito forte, mar muito grande, o barco todo molhado.
Nessa hora, estava todo mundo de cinto. Ninguém pode se mexer muito. Perigoso por causa de acidentes… Por exemplo, no barco, eu nunca deixo a água quente em nenhum lugar. Você está numa travessia, você está 4 dias de lugar seguro, 5 dias do outro. Ter um acidente muito grave, uma queimadura, uma fratura, ou alguma coisa, o cara vai sofrer 5 dias. Nós temos remédios a bordo, alguma coisa que pode diminuir esse sofrimento? Sim, mas não vai resolver totalmente. Precisamos nessa hora ter mais cautela, então os movimentos diminuem, todo mundo se mexe menos, naturalmente come-se menos, aí as comidas passam a ser comida/ração.
Daniel: Ah! Uma coisa, só para você saber. Duas ou três vezes nós jogamos camarão fora. É que a gente compra camarão congelado. Toda vez que vamos sair a geladeira fica ligada e ainda tem gelo, para aumentar a conservação. Aí se fizemos o primeiro pacote camarão com massa, passou três, quatro dias, acabou o gelo e o camarão está lá. Se olhar, ele está perfeito, mas pode não estar bom. E a gente não pode se dar o luxo de comer alguma coisa que não esteja boa e aí jogamos fora.
Gusmão: Então, não comemos nada que não esteja 100% seguro, nada. Aí você vai falar dos peixes. “Ah, peixe”, nós pescamos bastante peixe e fizemos sashimi. Normalmente os peixes são pescados na parte da manhã, mas o peixe dura o dia inteiro. É muito peixe, né? Todo tipo, dourado, atum, atum grande, pescamos até barracuda no Caribe.
Daniel: No litoral de Porto Rico pegamos duas barracudas, bonitas, mas tivemos que jogar fora. Esse tipo de barracuda tem uma toxina que faz mal para nós seres humanos, então jogamos fora. Ela come coral, a barracuda tem um dente afiado. E ela morde o coral. E esse coral transmite uma toxina. E se você come, passa mal.
Marcelo Gusmão e o amigo Claudio Orfão com a barracuda do Caribe, na travessia de Porto Rico até as Bermudas.
Imagem da Ilha: Quando acontece um momento crítico na travessia, Daniel?
Daniel: Isso depende da direção das ondas, e se você precisa pegar o timão (volante do barco). Mas é raro. Para acontecer isso, o tempo tem que estar muito ruim. Pegamos o timão quando fomos da República Dominicana para Porto Rico, por 48h. Na verdade, nessa travessia não dá para você ficar apreensivo…
Imagem da Ilha: O monitoramento da posição de vocês era online? Como foi chegar no meio do oceano, ainda sabia que tinha um monte de mar pela frente. Como é que é essa sensação?
Gusmão: Nós temos um equipamento que chama Spot, que é um localizador via satélite. Se há algum problema, como a internet não funcionar, tem este outro equipamento que é um localizador pessoal. Ele envia as localizações, e serve para socorro, é um SOS (um sistema de socorro internacional). O mais interessante é que a gente monitora esse equipamento com algumas pessoas.
Algumas pessoas ficam sabendo onde a gente está, um familiar, um amigo, alguma referência de segurança. Mas voltando à sua pergunta: Essas travessias com mais de 2.000 milhas, naturalmente cria uma certa ansiedade.... Lá nas 1.000 milhas o cara pensa: "Pô, eu já estou na metade". Procuro até brincar: "agora tanto faz voltar como continuar, porque já passou da metade. Nesse momento, se você não se policiar, cria uma certa ansiedade para querer chegar logo. E por segurança, quando estamos perto da terra, a gente monitora esse tempo de chegada. Isso ajuda a diminuir a ansiedade de alguns tripulantes... Às vezes tem que diminuir a velocidade do barco para poder chegar em segurança, e na hora certa.
Imagem da Ilha: Como capitão, Gusmão, você definiu os horários de turno, de leme, na realidade como é o turno de ficar acordado?
Gusmão: Cada comandante define os turnos de uma maneira pessoal. Eu procuro combinar com a tripulação e levo em conta a experiência de cada um. Há aqueles que não conseguem dormir cedo. Tem gente que não consegue dormir de dia. Como estávamos em três, resolvemos fazer turnos de 4 horas. Com isso você tem mais tempo para dormir, descansar, acaba dormindo 8 horas por noite. Se houver algum problema, você está descansado. Então, o cara que começa a dormindo, começa a dormir de dia. Tem gente que não consegue dormir de dia......não relaxa, não descansa. Eu tenho esse perfil de juntar a tripulação e dizer: "Olha, vamos fazer os turnos". Aí, a gente combina e faz. E também os tempos, se você tem uma tripulação, no caso da última travessia Ilha de São Miguel (Açores) - Lisboa, éramos eu e o Daniel, os turnos eram de 2 horas.
Se o cara fica 3 horas acordado durante à noite, alguns momentos ele pode dar uma cochilada, dar uma adormecida... e isso pode comprometer a segurança, principalmente em lugar de grande tráfego de navios. Também os turnos são mudados de acordo com as condições do tempo. Teve momentos em que estávamos todos acordados. No momento da tempestade, nós ficamos praticamente a noite toda acordados. O cara se deitava um pouquinho, mas todo mundo ligado.

O barco Moleque "descansando" na chegada à ilha de São Jorge dos Açores.
Imagem da Ilha: Algum ponto mais crítico durante o ciclone, que vocês pensaram que podia dar ruim?
Gusmão: Não, acho que não chegou a esse ponto. Realmente o momento foi tenso, bastante tenso, quem está lá vivendo isso à noite, muito vento, tudo molhado. De dia é um pouco menos tenso. Mas no terceiro e quarto dia, entre Bermudas e Flores (Açores) pegamos uma tempestade de popa. Aí, passamos bastante tempo no leme. Isso foi um pouco mais tenso. As ondas não estavam muito grandes, na casa dos 4 a 5 m. Mas tinha muita onda desencontrada de norte e de oeste. Aí nós fizemos um turno sem piloto automático, foi a primeira vez que pegamos um pouco do leme. Aí mudamos o turno para uma hora, porque estávamos muito cansados.
Daniel: Teve uma noite que nós fizemos do Panamá para a República Dominicana, somente eu e o Gusmão, e resolvemos fazer turnos de 3 horas. No outro dia, estávamos os dois acabados. Aí resolvemos: "Não, 3 horas, 3 horas e pouco para cada um não dá". Vamos voltar às 2 horas cada um que é o melhor, ficamos muito exaustos. Não é que você deita e custa para dormir, leva 15 minutos para dormir. Tu deitou, “buf”, dormiu. Meio minuto depois tu dormes.
Chegando no arquipélago dos Açores
Gusmão: O cara aprende a dormir rápido. Lá pelo terceiro dia, tu está dormindo rápido, deita e já dorme.
Daniel: E aí tu descansa 2 horas, porque se der problema, levanta ele, levanto eu, levanta o outro... Agora na travessia de São Miguel dos Açores para Lisboa, duas noites, ficamos 4 horas eu e Gusmão acordados. Isso porque terminou o diesel no tanque antes do esperado, mas tinha outro tanque cheio de diesel, o problema é que tivemos que fazer a transferência de um tanque para o outro. Foram duas noites, assim, só deu problema com o diesel à noite. Foi preocupante porque estávamos entrando em rota de navio, teve uma hora que não tinha vento suficiente e também não podia ficar sem motor. Sem motor, com calmaria, não dá pra desviar de nada.
Imagem da Ilha: Quando as pessoas pensam num barco à vela, pensam em lazer. Quando vocês estavam lá, dava tempo de mergulho, ou não tinha como parar para dar um mergulho. Como era este lazer, tinha?
Gusmão: Quando estamos em travessia, o barco veleja 24h por dia… Quando o vento diminui ou acaba, passamos para o motor, e já aproveitamos para restabelecer a carga das baterias... Portanto, quando você sai para uma travessia, você acaba definindo uma meta de milhagem/dia. Nós tínhamos uma meta de 150 milhas/dia. Essa milhagem depende de cada barco. Tem barco que faz 200, outros fazem 100 milhas. O objetivo é atingir a meta para ficar na sua média definida.

Mesmo com calmaria, não tem mergulho. O único mergulho que teve foi quando tivemos um cabo de navio (corda de atracar) enroscado no hélice, a 300 milhas de ilha de Flores (Açores), aí eu tive que mergulhar para retirar esse cabo.
Gusmão e Daniel atravessando o Atlântico Norte. Veja o vídeo.
Daniel: Na verdade, mergulhamos muito pouco. Eu, nas Bermudas ou na ilha de São Miguel, nos Açores. Dá para contar nos dedos de uma das mãos as vezes que eu mergulhei na água. Só mergulhei para limpar o casco, e para revisar o leme. “Travessia dá trabalho, não é brincadeira.”
Imagem da Ilha: A chegada ao arquipélago dos Açores foi vista com emoção e alívio depois daquele ciclone que vocês pegaram?
Daniel: Foi um negócio novo. Na realidade, a emoção que eu pensei que não fosse dar e deu, foi quando eu avistei Lisboa. Eram 9 ou 10 horas da manhã, o nevoeiro começou a dissipar. E aí a gente avistou terra. Eu disse: "Caraca". Aí sim, me emocionei por ter atravessado o Atlântico, de ter saído lá do Panamá.
Chegada à Lisboa! Gusmão e Daniel a bordo do Moleque. Veja o vídeo.
Gusmão: É, isso que é o legal da travessia, sabe? Não é nem o alívio de estar chegando em terra. Porque quando a gente chega em terra, não quer nem descer do barco. Entende? Porque você passa um tempo nesse ambiente do barco, esse ambiente fora da cidade grande, fora de barulho. Quando tu começa a chegar na cidade grande, tu começa a ficar assim: "caramba, que merda isso aqui".
No arquipélago dos Açores foi engraçado, porque aí você vai para uma ilha muito pequena, e depois termina numa ilha muito grande. A ilha de São Miguel é enorme, é tipo Floripa, ou talvez até maior. Já é cidade grande!!!!
Daniel: Maior! Tem 700 e poucos quilômetros quadrados. A ilha de Floripa tem 460. Só que São Miguel tem 134 mil habitantes a ilha inteira.
Imagem da Ilha: Qual a sensação da terra à vista?
Gusmão: É, a sensação de dever cumprido, você chegou onde você queria chegar. Isso é muito legal. Então, chegar nos Açores foi muito legal, certo, Daniel? Porque os Açores é um lugar que pouca gente vai, por estar isolado no Atlântico Norte.
Daniel: Lugar caro é Bermudas (risos). Nas Bermudas, chegar e tomar long neck é 15 dólares. Bermudas é um assalto.
Momentos de lazer: Amigos e tripulantes Marcelo Gusmão, Daniel Gomes e Décio Novaes depois da grande aventura da travessia em um momento de lazer dentro do vulcão do Corvo.
Momento de lazer: Passeio dentro da cratera do vulcão do Corvo após a travessia do Atlântico. Veja o vídeo.
Imagem da Ilha: A saída de vocês de um lugar é muito estratégica, certo? É a partir de uma janela no tempo que o estrategista passa para vocês. Como é que funciona isso?
Gusmão: Exatamente. E, isso vale para qualquer travessia. As travessias menores, você mesmo decide. Aqui no Brasil a gente viaja um pouco mais sozinho, sem qualquer apoio de terra. Porque já se conhece a incidência dos ventos, o regime do vento, e como ele funciona. Aí você monta a tua estratégia de navegação em função da previsão do tempo e do tempo de chegada, você faz a conta para sempre chegar durante o dia.
Daniel: Numa travessia longa, você começa a fazer o cálculo, no final faltam dois, três dias para chegar, certo? Então começam os ajustes "ah, diminui a vela ou aumenta a vela", entendeu? Para fazer o barco andar mais ou menos rápido, para poder ajustar para chegar pela manhã. E aí se a travessia for de 12 dias, lá pelo nono dia você já começa a regular a velocidade do barco para conseguir chegar de dia, de preferência na parte da manhã no teu destino. "Ah, de manhã não vai dar, mas vamos chegar até 4 horas da tarde, 5 horas da tarde".
Gusmão: Acontece, às vezes, por algum motivo, você tem que chegar à noite, né? Mas o mais certo, se não conhece o Porto, é não chegar à noite. Fica fundeado fora do porto, ou mesmo navegando, e espera amanhecer, aí entrar no porto.
Imagem da Ilha: Qual é a maior preocupação dessa chegada? Tem possibilidade de bater em alguma coisa?
Gusmão: Bater é difícil. Porque hoje as cartas estão num sistema muito evoluído. O sistema de GPS também está muito evoluído. O GPS está cada vez mais preciso. Com precisão de 3 m, 2 m. Então, bater em alguma coisa você, não vai bater. Perto da terra você tem pequenas embarcações. À noite, você não tem a parte visual que é muito importante... não dá pra ir só na tela, né?!! Você precisa do visual. Então, por segurança e por tranquilidade é melhor chegar de dia.
Daniel: À noite, se você está chegando, velejando, e saiu um barquinho pequeno para pescar, o cara pescando, você não vê.. aí já está em cima do cara. Ou um barco pesqueiro grande pode te abalroar... Essa possibilidade existe.
Na chegada a Portugal, estávamos com medo das baleias orca, porque tem muitas e estão atacando os veleiros. Tem, inclusive, um barco que estava no nosso barlavento, umas 100 milhas, que foi atacado.
Tínhamos uma estratégia para o encontro com as orcas. Existe um aplicativo que monitora a presença delas em algumas regiões da Europa. Tínhamos uma corrente presa à popa nos dois bordos, Sacos de areia, um em cada lado do barco para jogar na água, pois dizem que é bom, que ela (baleia) não gosta de areia, nem de cloro. Então também tínhamos uns 4 ou 5 galões de cloro para jogar na água, e tentar espantar as orcas.
Aí quando estávamos chegando a Portugal, não deu tempo de pensar na baleia. Isso porque tinha um tráfego intenso de navios, ventos fortes, e uma neblina que mal dava para ver a proa.
E ainda tinha um agravante…nem toda embarcação tinha o AIS, que é o transponder (identificador de embarcação), alguns navios que nós cruzamos não tinham transponder. E se você se encontra à uma distância boa dá pra desviar, se não é colisão na certa.
Gusmão: Sim, provavelmente com eletrônicos avariados, porque algum desses que passamos, não conseguimos captá-lo no nosso AIS.
Imagem da Ilha: Vocês sempre foram na vela e eventualmente com a diminuição do vento, usaram o motor, mas chegando próximo a Portugal, como foi isso?
Gusmão: O motor usamos em algumas ocasiões: Uma, quando você não tem vento e outra quando você tem um problema de energia. Porque o motor também ajuda a carregar as baterias. O Moleque conta ainda com energia solar e eólica.
Imagem da ilha: Marinheiro tem superstição?
Gusmão: O homem do mar é cheio de superstições. Antigamente os mais velhos, com quem eu aprendi, tinha uma superstição que era nunca sair na sexta-feira. Que sair na sexta-feira dava azar. Aí alguns deles se ferraram porque não saíam na sexta-feira para sair no sábado e acabavam pegando o tempo ruim. Assim, são todas superstições, certo? Aquela história da banana… não levar banana no barco. Mas isso é história de antigamente, que o cara jogava casca no convés, aí o marinheiro pisava na casca... Tem gente que não leva banana, não leva galinha, frango de jeito nenhum. Ainda existem essas superstições. Eu já não tenho mais nenhuma.
Imagem da Ilha: Qual é a próxima aventura? E você, Daniel? Qual será a próxima aventura? Já tem próximos passos?
Gusmão: Então, a ideia é que o Moleque fique na Europa. A estratégia é a gente sair com o Moleque de Lisboa, e levá-lo para dentro do Mediterrâneo. A ideia é ir até o Mediterrâneo e ficar lá dentro pelo menos uns três a quatro anos.
E o Mediterrâneo tem grandes travessias? Não, mas o Mediterrâneo é o celeiro dos barcos, e lá tem muita coisa para conhecer. A própria entrada ali do Estreito de Gibraltar já é uma aventura. Lá tem o problema das orcas de novo, já que as orcas estão muito mais presentes no Estreito de Gibraltar. 90% dos acidentes acontecem naquela região.
Imagem da Ilha: É muito estreito?
Gusmão: De estreito não tem nada. Mas tem uma corrente fortíssima, porque muita água entra e sai do Mediterrâneo. A Europa também tem outro desafio, que é o inverno. O Caribe não tem inverno. A gente sempre tinha pouca roupa de inverno no barco. Passamos até um pouco de frio uns dias.
Imagem da Ilha: Então a próxima aventura vai ser desbravar o Mediterrâneo?
Gusmão: Essa é a ideia. Esse é o projeto. E existem projetos para voltar para o Pacífico? Sim, existe. Daqui a não muito tempo. Se for para o Pacífico, é daqui a 3, 4 anos. E a ideia é ir para o Pacífico e fazer a travessia de volta, Mediterrâneo, Canárias, Caribe de novo. Aí, vindo por baixo do Atlântico Norte.
Caso não tenha lido a primeira parte desta entrevista/aventura clique AQUI e leia.
Contribuíram com a entrevista
Decupagem: Carolina Beux
Edição: Hermann Byron
Revisão: Carolina Beux
Revisão final: Marcelo Gusmão
Edição final: Carolina Beux
Fotos e vídeo: Marcelo Gusmão
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