Atos terroristas afastam investimentos e tornam pior o que já estava ruim
Após dois anos de estagnação de vendas indústria automotiva projeta um ano com baixo ou nenhum crescimento, mas instabilidade pode piorar ainda mais o cenário
Após a instabilidade institucional causada pelas hordas golpistas que invadiram Brasília na tarde desse domingo, 08, mesmo que tivesse dinheiro – o que já é uma limitação relevante nos dias atuais – quem teria coragem de investir na compra de um veículo novo?
A mesma pergunta vale para qualquer bem de alto valor e pode ser feita a empresas e investidores com planos de colocar dinheiro no Brasil. E a resposta é que os vergonhosos eventos terroristas têm efeito negativo imediato na imagem internacional do Brasil, o que deve provocar adiamentos, de pelo menos seis meses, em investimentos que estavam em curso ou que deveriam ser decididos nos primeiros meses de 2023.
É o que disse à coluna, sob reserva, um experiente negociador dos interesses de empresas junto a governos. Segundo ele o sentimento geral é de preocupação e de precaução ante a obrigação de prestar esclarecimentos a acionistas estrangeiros, que compõem quase toda a indústria automotiva instalada no País.
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Essas corporações, diz o interlocutor, vão esperar as ações do novo governo para entender se isso pacifica o País e ordena os temas econômicos, para só então decidir se vão continuar, suspender ou desistir dos investimentos por aqui. O dano já está feito, mas quanto mais rápido e objetivamente o governo agir, menos ruim será.
O fato é que, embora apenas uma pequena e ruidosa parte da população brasileira seja apoiadora da barbárie e do obscurantismo político pregado diuturnamente nos últimos quatro anos, todos no País vão pagar o preço do desatino terrorista.
Dinheiro não gosta de confusão
Convém lembrar que fabricantes de veículos têm programados investimentos no Brasil que somam algo como R$ 36 bilhões no período 2022-2026, segundo declarações das próprias empresas. São recursos para o desenvolvimento de novos produtos, tecnologias e processos industriais – o que, diga-se, desenvolve aqui veículos infinitamente mais evoluídos do que era aqueles produzidos no período da ditadura militar tão exaltada por baderneiros e figuras delirantes do governo passado.
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Por muitas vezes Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, associação que reúne os fabricantes de veículos no País, afirmou que todas as corporações precisam de previsibilidade para decidir investimentos. É algo difícil de alcançar enquanto o governo perde precioso tempo tentando conter hordas golpistas, em vez de discutir e resolver as muitas questões sociais, ambientais e econômicas que travam o desenvolvimento brasileiro.
Como disse um investidor ao site NeoFeed, “dinheiro não gosta de confusão; quando existe confusão o dinheiro sai e espera”. Ou seja, enquanto pela porta da política o governo Lula recebe efusivos apoios institucionais ante à barbárie, pela porta da economia empresários e investidores tiram recursos do País.
Esse movimento já estava acontecendo pela má vontade atávica que a maioria dos empresários tem a qualquer governo dito de esquerda – nem que seja um milímetro à esquerda – e agora a fuga de capitais pode se aprofundar com a instabilidade instalada.
Se as previsões já não eram boas o cenário atual só piora as coisas. “Os dramáticos acontecimentos no Brasil ontem, quando os apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro montaram uma insurreição, causarão tremores políticos nos próximos meses ou anos”, escreveu na segunda-feira, 9, Adam Roberts, editor digital da revista britânica The Economist.
Previsão de ano estagnado
Antes de o cenário ser criminosamente piorado pelas hordas golpistas, já não eram boas as previsões para o mercado nacional de veículos, que fechou 2022 estagnado, estacionado na casa de 2 milhões de unidades vendidas pelo segundo ano consecutivo.
Preços excessivamente altos dos carros no País, vendidos ao valor médio de R$ 140 mil no ano passado, aliados a juros que tornam os financiamentos inacessíveis, estão limitando o mercado brasileiro a um piso que pode ser ainda inferior a 2 milhões – número que, segundo a Anfavea, não corresponde ao tamanho do Brasil e idealmente deveria ser acima dos 3 milhões, para uma indústria que tem capacidade instalada acima de 4 milhões/ano.
Pior ainda é que, diante do cenário de produtos muito caros e crédito restritivo, a previsão é de mais um ano de estagnação. A Anfavea divulgou, na sexta-feira passada, 6, projeção de crescimento insignificante de 3% nas vendas de veículos – ou de 4% considerando só automóveis e comerciais leves, algo em torno de 2 milhões de emplacamentos.
Um dia antes a Fenabrave, que representa os concessionários, divulgou que projeta em 2023 um nada alentador novo empate com 2022, não mais do que 2,1 milhões de emplacamentos, ou 1,96 milhão só de modelos leves.
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Se tivessem esperado pelo fim de semana para divulgar suas projeções é bastante provável que elas seriam ainda piores. Mas, como também disse o presidente da Anfavea, “esperamos estar errados, já que o Brasil sempre nos surpreende”. Para o bem e para o mal, como ficou exposto no último domingo.
Texto escrito por Pedro Kutney, jornalista especializado em economia, finanças e indústria automotiva. É autor da coluna Observatório Automotivo, especializada na cobertura do setor automotivo, e editor da revista AutoData. Ao longo de mais de 35 anos de profissão, foi editor do portal Automotive Business, editor da revista Automotive News Brasil e da Agência AutoData. Foi editor assistente de finanças no jornal Valor Econômico, repórter e redator das revistas Automóvel & Requinte, Quatro Rodas e Náutica
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