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As máscaras caem… Por André Vasconcelos
Bastidores do setor revelam como parte da gastronomia premiada sobrevive mais de marketing que de talento real

As máscaras caem… Por André Vasconcelos
Assessoria e redes sociais criam personagens que se tornam celebridades, mas não necessariamente chefs competentes. (Foto: Divulgação)

Publicado em 14/08/2025

“Em caso de despressurização, máscaras cairão automaticamente.
Coloque a máscara de oxigênio primeiro em você…
… e só depois auxilie os outros, caso necessário.”

Mensagem tatuada nas mentes de quem viaja: salve-se antes de salvar o outro. E a mensagem implícita é fundamental para sobrevivermos em muitas situações, não só quando o perigo é iminente.

Podemos aplicá-la a muitos papos e discursos do dia a dia: não há como salvar da ignorância, ensinar ou servir de exemplo sobre algo que não temos total conhecimento… E para ter essa segurança, o estudo, o treino e a humildade são fundamentais!

Mas essa obviedade parece não fazer parte desta nova geração. Influencers surgem aos borbotões vindos das catacumbas do egocentrismo com conhecimentos que só eles têm! E não importa a área, eles são mestres doutorados em tudo!

E na gastronomia então, é impossível enumerar os influencers e chefs laureados por uma linda decoração, um cardápio moderninho, um “business plan” fantasioso, um “budget” criado a preço de ouro e prêmios The Top, 10best, 840best ou simplesmente, só prêmios bestas.

A tempo, nessa geração, tudo que é sério e moderno é escrito em inglês, de preferência com siglas: KPI, ROI, workflow, benchmarking, headcount entre tantos! E com essa mentalidade, surge a glamourização gastronômica de quinta série C!

Um bando de crianças mimadas crescidas que se tornaram chefs mimados, conhecimento de internet e donos da razão… “knowledgeables” do universo gastronômico. Ditando regras de comportamento, defendendo as minorias, apresentando receitas desconexas, fazendo uso de produtos incomíveis, enquanto, no fundo, continuam sendo os mesmos e vivendo como nossos pais… e às custas deles.

Muitos alçados ao sucesso por agentes — sim, assim como em qualquer profissão —, ser chef “reconhecido e festejado” passa pelas mãos de assessorias que criam personagens ensaiados, com biografias montadas e comportamento milimetricamente estudado: marionetes de dolmãs!

Chefs marionetes onde os fios fictícios controlam cada movimento, cada discurso e cada receita, muitas vezes criadas por inteligência artificial, já que a inteligência natural está fora de moda em tempos de influencers e dos millennials.

Mas, se as máscaras caem, como ficam esses chefs tão respeitados? Talvez o fim da gastronomia contemporânea e premiada! E qual o preço desse sucesso???

Tudo que puderem pagar, afinal, dinheiro compra tudo, pensam muitos deles: vale tudo para alcançar o sucesso!!! Só que não…. felizmente não!!!!!

As coisas e serviços que se fiam em altos preços, e têm o alto faturamento como foco principal, em geral, não têm valor!

Mas, se a cabine for despressurizada, as máscaras caem! E o tempo despressuriza… não há personagem que se torne real por todo o tempo!

Entre os muitos discursos, o comer saudável, o respeito ao pequeno produtor, o produto regional, a cozinha raiz… quase tudo balela, quase tudo discursos… Muitas vezes os insumos vêm mesmo dos fornecedores mais baratos e a vulgar pescada congelada embarcada é descongelada na água da torneira da pia, podendo ser apresentada no cardápio como um peixe nobre vindo de pescadores artesanais.

A evolução do ser humano involuiu, e, no geral, não somos mais os mesmos e nem vivemos como nossos pais… somos uma versão piorada a cada geração.

E isso não é uma visão pessimista minha… sou um otimista nato!

A Fábrica de Cretinos Digitais, livro do neurocientista francês Michel Desmurget, tem dados concretos e de forma conclusiva, com evidências palpáveis, apontando que as novas gerações são menos inteligentes que as anteriores.

"Simplesmente não há desculpa para o que estamos fazendo com nossos filhos e como estamos colocando em risco seu futuro e desenvolvimento", alerta o especialista em entrevista à BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC… isso em 2020.

E isso afeta tudo, todas as profissões, ainda mais as que no Brasil nem reconhecidas são, como a de cozinheiro. Qualquer “talento” pode se tornar “chef” sem ao menos ter que cursar qualquer curso: basta ter dinheiro, afinal, dinheiro compra tudo, até a profissão de “chef”!

Lutamos tanto para revelar os bastidores de cozinhas laureadas por prêmios que não têm o menor valor diante do pouco profissionalismo e da falta de respeito com subalternos e companheiros de profissão! Lutamos como profissionais de cozinha para mudar isso, mas aos poucos isso está se tornando somente um discurso antiquado de chefs antiquados.

A nova geração na cena gastronômica diz respeitar as cozinheiras, as chefs, as minorias, mas é notório que não entenderam o que é respeitar… muitas vezes são só falares decorados, e continuam os mesmos e vivem com a cabeça dos seus pais.

Mal sabe essa nova geração que estudos indicam que o preparo de alimentos, uma atividade exclusivamente humana, provavelmente é a profissão mais antiga do mundo, surgida há cerca de dois milhões de anos!

E esse cozinheiro surgiu quando o primeiro humanóide, o primeiro Pitéco, aprendeu a usar o fogo no preparo da sua caça para receber sua pretendente para jantar na sua caverna: impressionar com um filé de brontossauro para depois abater a presa que realmente interessava a ele: a convidada!

Observação: desculpe-me pela citação machista, mas estamos falando de dois milhões de anos atrás, quando nem existiam sutiãs para as feministas queimarem!

O cozinheiro é pré-histórico, uma profissão que não parou de evoluir, e uma das poucas que, eu acho, não será substituída por um computador de última geração.

Não teremos a Rosie, a empregada-robô do The Jetsons, no comando de cozinhas automatizadas com impressoras de alimentos 3D! E muito menos pílulas de alimentos como refeição, como no livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley!

Afinal, cozinhar é a forma mais humana de se conectar! Cozinheiros têm que continuar evoluindo para garantir um mundo melhor e não somente mais likes e engajamentos… e temos que lutar para isso!

Bom apetite!

 

 

 

 

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Sobre o autor

André Vasconcelos

André Vasconcelos

Cozinheiro raiz e autodidata, hoje no comando de sua Cozinha Singular Eventos e d'O Vilarejo Hospedaria e Gastronomia, onde insumos e técnicas são a base de cardápios originais e exclusivos... e aprendiz de escritor também!


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