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Aldo Nunes – pelos caminhos da memória, por Fernando Teixeira

Exposição Centenário Aldo João Nunes. (Foto: Exposição MASC) ***clique para ampliar foto

Publicado em 03/09/2025

Caminho pelas ruas de minha cidade à procura de vestígios que me façam compreender seu passado e quem sabe retirar lições que me possibilitem entender o que ainda está por vir.

Pelas calçadas estreitas e cheias de histórias, revisito lugares que resistem ao tempo, mesmo que estes encontrem-se apenas impregnados em minhas remotas lembranças.

 Os famosos perfis de Florianópolis, de Aldo Nunes - Fonte Exposição MASC. 

 

Meus olhos percorrem atônitos as transformações que se sucedem no espaço urbano a cada piscar de olhos. Tenho dificuldade em enxergar com clareza as implacáveis mudanças que alguns insistem em afirmar tratar-se de avanços necessários que irão ditar os rumos do futuro, tamanha a velocidade com que vão sendo eliminados os tênues traços que ainda nos permitem reconhecer nossa identidade, algo absolutamente fundamental na construção do tecido social.

Por entre os velhos casarios outrora existentes nestes mesmos lugares que agora percorro, transformados pela modernidade, outros também passaram, carregando consigo olhares e preocupações que se assemelham às que hoje tanto nos inquietam.

Em cada lugar, há sempre personagens que deixam marcas profundas, contribuições valiosas que perpassam tempo e espaço e que nos permitem seguir adiante sem perder de vista aspectos importantes de nossa trajetória até aqui.

 Morro do Mocotó, por Aldo Nunes - Fonte Exposição MASC.

 

No CIC – Centro Integrado de Cultura, uma bela exposição celebra o centenário de Aldo João Nunes, um florianopolitano apaixonado por esta ilha e que viveu, com intensidade, o desejo de que aqueles que o sucedessem pudessem conhecer, através de seus inúmeros trabalhos, um pouco da vida e da história desse lugar.

Preocupado com a forma como via sua Florianópolis crescer, não poupava críticas ao modelo de desenvolvimento que vinha sendo adotado, que em nome de um suposto progresso, virava as costas para o passado, sem dar a devida valorização a sua memória urbana.

Percebendo a acelerada mudança por que passava a cidade, sobretudo a partir da década de 1970, Nunes desenvolveu uma intensa produção de desenhos e aquarelas que retratavam a paisagem urbana que pouco a pouco ia desaparecendo diante de seus olhos.

Casas antigas da cidade, por Aldo Nunes - Exposição MASC.

 

Neste período, o brilhante professor do Instituto Estadual de Educação intensificou uma velha prática: percorrer a cidade, onde munido de lápis, papel e aquarelas, registrava com seu talento paisagens e edificações que ainda resistiam aos apelos dos novos tempos.

Aquilo que já havia desaparecido, Aldo as resgatava. Valendo-se de sua memória, de sua relação de proximidade com a paisagem urbana, ou mesmo através de fotos antigas, as mantinha vivas utilizando-se de seu inconfundível traço para reproduzi-las.

Para a arquiteta e historiadora Eliane Veras da Veiga, a cidade deve muito a Aldo Nunes. Segundo ela, até a consolidação do decreto municipal 270/86 (Tombamento do Patrimônio Histórico da Área Central de Florianópolis), muita coisa se perdeu e os registros do professor Aldo compõem um precioso repertório sobre essa riqueza artística e arquitetônica que havia na paisagem antiga da cidade.

Professor Aldo Nunes e seus alunos - Fonte Exposição MASC.

 

“Ele era incansável com seus desenhos e pinturas”, afirma a arquiteta.

Outra paixão de Nunes eram os brinquedos infantis. O artista dos traços e das pinturas também dedicou parte de sua vida a confeccionar e colecionar peças que depois seriam levadas às escolas para que os pequenos passassem a conhecer as brincadeiras de tempos mais remotos. Hoje, a coleção contendo mais de sessenta brinquedos encontra-se à disposição do público no Museu da Escola Catarinense, no centro da capital.

Na juventude, Aldo Nunes participou ativamente da vida esportiva de Florianópolis, tanto na condição de atleta como também de dirigente. Integrou, com destaque, equipes de basquete e voleibol da Federação Atlética Catarinense. Como jogador de futebol, Nunes atuou pelo Avaí Futebol Clube, agremiação da elite do futebol de Santa Catarina e seu time do coração.

No Instituto Estadual de Educação, além de exercer o magistério, também foi seu Diretor. Em 1969 assumiu a direção do Museu de Arte Moderna de Florianópolis, posteriormente denominado Museu de Arte de Santa Catarina, onde permaneceu até 1981.

Já mais velho e reconhecido no meio artístico, Aldo resolveu dedicar-se à conservação e restauração de bens culturais. Obstinado, concluiu um curso de especialização nesta área, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais.

Aldo Nunes no Ateliê de Conservação e Restauração da FCC - Fonte Exposição MASC.

  

Ainda durante os anos de 1980, percebendo a necessidade de dar mais dinamismo a este setor, participou ativamente na criação do Ateliê de Restauração e Conservação de Bens Culturais Móveis da Fundação Catarinense de Cultura (ATECOR), sendo responsável pelo mesmo de 1983 a 1995.

Aldo Nunes teve uma vida dedicada ao magistério, à arte, à cultura e sobretudo à preservação da memória, das imagens e lugares de sua cidade.

Visitar a exposição “Centenário Professor Aldo João Nunes”, em cartaz no Museu de Arte de Santa Catarina até 12 de outubro, é uma maneira de homenagear este grande florianopolitano e poder reviver, através de suas obras, um pouco da Florianópolis que já não existe mais.

Se eu fosse você, não perderia!

 

 

 

 

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Sobre o autor

Fernando Teixeira

Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFSC), mestre em Geociências e Doutor em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), natural de Florianópolis. Atualmente tem se dedicado à fotografia.


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