Os caminhos da harmonização ideal
Uma das coisas mais faladas no universo dos vinhos é sobre a harmonização com alimentos e sua mágica de criar novos sabores e experiências. Até parece uma coisa perfeita quando pensamos assim, mas a realidade é muito diferente dessa visão. Muitas vezes a harmonização é super valorizada e difícil de realizar, outras vezes é simplesmente desnecessária e tira toda a espontaneidade do momento. Mas, lógico que quando quero fazer um grande evento, apresentar um excelente chef ou um ótimo vinho, prefiro ligar os pontos, conversar, provar e harmonizar da melhor maneira a ocasião, as ideias e a refeição. Fazendo isso, a experiência fica ainda mais memorável.
Nessas horas, vários alimentos são muito difíceis de harmonizar, são velhos conhecidos dos sommeliers e fazem parte da lista que dá dor de cabeça quando os percebemos entre os ingredientes. São eles: aspargo, chocolate, shoyu, sashimi, alho, alcachofra, vinagrete, pimentas e queijos como o gorgonzola. Lógico que teríamos muito mais, porém são alguns dos mais encontrados por aí.
Todos possuem suas dificuldades particulares. O chocolate, por exemplo, tem gordura, tanino e doçura. Quando tomamos um vinho seco, este limpa a gordura e a doçura e deixa o tanino amargo, mas fica sem graça. São muitas tentativas de harmonizar chocolates com vinhos e o que eu encontrei de mais correto são os vinhos do Porto, principalmente da categoria Late Bottle Vintage (LBV) com alto teor alcoolico e doces.
Aspargos, alcachofras, brócolis, alho e couve de Bruxelas são alguns dos alimentos mais difíceis. Eles possuem diversos fatores em comum que não permitem o casamento com vinho. São alimentos com componentes sulfurosos que imitam defeitos no vinho, além de alguns deles possuírem elevado índice de clorofila, como o aspargo, dificultando ainda mais o processo. Nesse caso, para conseguir um pouco de sucesso precisamos de um Sauvignon Blanc bem seco e com ótima acidez, ou um bom Grüner Veltliner da Áustria. Uma alternativa radical com o aspargo seria um Jerez Fino, que é bem seco e terroso.
Excesso de pimenta anula nossos receptores, além de que o álcool no calor causado pela pimenta nunca é bom. Um vinho com leve residual de açúcar e altíssima acidez, como um Riesling alemão, pode dar água na boca e contrapor o picante. Falei também sobre queijos mofados, como gorgonzola e roquefort, que possuem um compontente que cria um odor muito intenso, além de terem sabores marcantes, sobrepondo a maior parte dos vinhos. Aqui precisamos do conjunto acidez-álcool-doçura de um bom Porto.
E finalmente temos uma das cozinhas mais presentes ultimamente na nossa região, com seus peixes crus e molhos de soja: a culinária japonesa. Uma pesquisa descobriu que o pouco de ferro que temos no vinho tinto combinado com os óleos do peixe cria um gosto metálico na boca. Neste caso um vinho branco seco com alta acidez como Riesling e Sauvignon Blanc combinam, mas meu preferido é um bom espumante ou champanhe extra Brut. Outro vilão é o molho shoyu com muito sal e um gosto azedo com grande carga de umami. É um desafio e tanto! Duas coisas podem ser feitas: criar uma combinação agridoce com um espumante Moscatel ou um vinho com características Umami como a uva Carignan do Sul da França.
O desafio é grande, mas como sempre digo, é um prazer testar tudo isso!
Sobre o autor
Eduardo Machado Araujo
Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers
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