Os Sensíveis - Entre a Dor e a Beleza, por Denise Evangelista
O que parece fragilidade é, na verdade, uma força silenciosa que traduz a complexidade humana em arte, poesia e sentido

Numa sociedade hostil a sensibilidade é tida como fraqueza, mas há, nessa concepção, um paradoxo. Se “o mundo sempre esteve para se acabar” como disse Fernanda Montenegro, parece que agora ele está bem mais próximo de estar. A intensidade tem sido a marca dos nossos dias. Tudo é muito! Mesmo quando esse muito é muito pouco, se pensarmos em termos da escassez das condições de vida, especialmente em territórios desiguais. Também é muito na falta de tempo ou de delicadeza.
Entretanto, desde sempre, quando tudo ainda não era muito, existiram e continuam existindo, seres que perseguem a beleza porque, parece, a necessitam mais do que os demais. A beleza como antídoto da dor. A experiência do belo, como vivência subjetiva capaz de compensar os impactos da feiúra do mundo.
Para esses seres é difícil não ser afetado pelo mundo, com tudo que nele há. Eles vêm ao mundo dotados de alguma coisa, ou na conjunção de suas próprias experiências, vão se tornando pessoas que não se moldam ao conformismo, nem tampouco à superficialidade. A indiferença não é alguma coisa com a qual possam se apegar, apesar de tentarem algumas vezes. Lutam pela criança que vive em cada um de nós. Comumente são eles os tradutores desse mundo, que se estende desde a subjetividade até o mais distante céu. São escritores, poetas, músicos, atores, dançarinos, artistas das mais variadas formas de expressão. São os criadores de novas realidades, os inventores, os pesquisadores, os inquietos – se a realidade não é satisfatória, eles imaginam outra. Também estão atrás das páginas dos livros, ouvindo música, saboreando pratos de outros seres sensíveis, escondidos no meio da plateia ou em outros tantos campos da atividade humana, em todos os lugares, sempre que se dão inteiros. Os sensíveis não são os que sentem mais do que os outros, o bom e o ruim, o prazer e a dor, mas são aqueles cuja sensação os captura e, sob impacto, reagem de forma criativa, sempre que encontram alguma ferramenta ou brecha para isso. Para os sensíveis não é possível fazer de conta, seguir em frente, repetindo padrões, se estes não fizerem sentido para eles. Há neles uma rebeldia. Os sensíveis se expressam de maneira espontânea ou original, se assim puderem fazer. E se não puderem, continuarão a perseguir a beleza do mundo, porque para eles, a beleza é uma necessidade. E vão usar de metáforas, de sinais ou de sintomas. Os sensíveis transbordam e querem entender o próprio transbordamento, nem que para isso precisem mergulhar em águas profundas. E é aqui que volto ao paradoxo que mencionei no começo. Para enfrentar a vida exige-se força, coragem, bravura, persistência e resiliência. A sensibilidade no nosso mundo é vista como fraqueza. Viver nunca foi fácil, mas a contemporaneidade tem exigido muito da maioria de nós. As estatísticas sobre o crescente sofrimento mental, não nos deixam mentir. Para enfrentar águas profundas no meio desse turbilhão, é preciso coragem. Os sensíveis são buscadores de sentido, querem desvendar o mistério e se arriscam. Como disse o maravilhoso Rubem Alves, “as palavras só têm sentido se nos ajudam a ver o mundo melhor. Aprendemos palavras para melhorar os olhos.” Os sensíveis estão sempre nesse exercício de melhorar os seus próprios olhos e, às vezes, ajudam outros buscadores a melhorarem os seus. Por isso, esse pequeno texto é só um elogio aos sensíveis, de todos os lugares e de todas as situações, porque é preciso continuar buscando as belezas do mundo para, por um instante, podermos flutuar nas asas de uma borboleta colorida.
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Sobre o autor

Denise Evangelista Vieira
Psicóloga formada pela UFSC e em Artes Cênicas pela Udesc. Escreve sobre o universo humano. Quem somos e em quem podemos nos tornar? CRP 12/05019.
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