QUANTA HIPOCRISIA!
Estou pensando em pedir desculpas toda vez que vender uma garrafa de vinho. Não pelo fato de ser uma bebida deliciosa, saudável (em moderação), complexa e versátil, podendo ser bebida, tomada, degustada, apreciada e até exibida em tantas ocasiões diferentes. Mas por estar vendendo um líquido que carrega preços abusivos no nosso País. Sendo um empresário do setor, me sinto incapaz de competir, empregar e crescer nesse mercado, pois parece que vendemos algo quase ilegal tamanha falta de incentivo que observamos.
Há cerca de três anos, vinhos que vendíamos a R$ 50 hoje custam mais de R$ 100 e, na sua origem, continuam custando o mesmo. Culpa dos impostos abusivos, estaduais e federais, custos astronômicos em toda a cadeia, burocracias estúpidas ao entrar no País e tudo mais que possa atrasar essa belíssima e milenar indústria.
Toda vez que viajo tenho vontade de ficar e não voltar mais. Hoje, a carga tributária de um vinho no Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Pesquisa Tributária, é de 63,84% e 83,84% para nacionais e importados, respectivamente. Soma-se isso aos nossos custos operacionais, os abusivos encargos de se ter um funcionário, ou seja, você é penalizado por empreender e gerar emprego. Temos, no final das contas, um governo que não fez absolutamente nada e ganha mais do que o produtor do vinho, o importador e o distribuidor somados, eles que assumiram todos os riscos.
Sei que o lobby da indústria cervejeira é enorme, por isso eles têm cargas menores, sei que o Brasil é relativamente novo na produção do vinho, mas temos dezenas de milhares de famílias produtoras de uva e algumas centenas produtoras de vinho, que dependem desse mercado, e os menores estão fechando as portas.
Ao contrário do que se faz na Europa e em tantos outros países com sabedoria e cultura, o vinho é tratado como alimento e taxado como tal. Poderíamos simplesmente levar em consideração os mais de 2 mil estudos envolvendo diretamente vinho e saúde e perceber que é uma bebida muito longe do supérfulo e absurdamente diferente dos destilados e, mesmo assim, não o fazemos.
E parece que hoje o nosso brilhante governo quer que a indústria do vinho salve a economia, pois acabou de elevar a carga de IPI para 20%, um mercado que corresponde com uma fração de um grão de areia numa praia para a economia nacional foi escolhido para arrecadar mais. É claro que o mercado bilionário da cerveja não tinha capacidade para isso, afinal, as cifras de patrocínio de campanha devem ser vitalícias.
Poderíamos ter uma população com potencial para beber vinho nas quantidades recomendadas por médicos e, consequentemente, ter uma população que iria beber melhor, com mais saúde e qualidade, além de termos no vinho um fator culturar enorme. Hoje o Brasil consome menos de uma garrafa de vinho fino por pessoa durante o ano. Um número que, se depender dos nossos representantes, irá permanecer estagnado.
E, para piorar toda a situação, principalmente do empreendedor sério, os comerciantes ilegais que praticam o descaminho, popular contrabando, dão pulos de alegria com as nossas fronteiras sem controle e com os receptores por aqui, pois quem critica corrupção, desvios e os roubos lá de cima estão felizes a comprar esses produtos ilegais. Grande hipocrisia!
Sobre o autor
Eduardo Machado Araujo
Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers
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