Opinião: Identidade é importante!
O desafio da vinha catarinense na criação de um estilo único
Há algum tempo, um ótimo produtor de vinho de Santa Catarina me fez uma difícil pergunta: “O que falta para nossos vinhos?”
Essa pergunta pode ser interpretada de diferentes maneiras, mas no contexto da conversa, onde estávamos degustando sua linha inteira e apontando qualidades e defeitos, eu entendi que era sobre qualidade e referência, tipicidade.
E sempre que me perguntam sobre a qualidade do vinho nacional eu respondo que estamos numa crescente, apesar de alguns passos para trás com uma busca por um estilo datado e que não condiz com nosso clima e com algumas legislações estúpidas criadas justamente pelo lobby de produtores, mas isso é outra conversa.
O fato é que, quando respondo isso, sempre digo que falta unidade, padrão, estilo. O Velho Mundo faz vinho há séculos, milênios, mas o chamado Novo Mundo sempre precisou de algum fato para se diferenciar e entrar no mercado. Argentina com Malbec, Chile com Carmenérè, mesmo essa não sendo sua principal uva qualitativamente e nem quantitativamente, até mesmo a África do Sul contou com a Pinotage para aparecer mais, apesar de fazer excelentes vinhos desde o Século XVII.
Quando visito vinícolas nacionais, ou provo suas linhas, percebo que existem dezenas de rótulos, dezenas de uvas diferentes e nenhuma assinatura.
E qual é a base de uma região clássica?
Respondo: sua ou suas uvas.
As regiões mais antigas do mundo existem até hoje da mesma forma que espécies animais sobreviveram, o mais adaptado e melhor fica. Com a uva não é diferente. São milhares de anos de adaptação às regiões originais e os locais foram ao longo do tempo descartando outras que não eram tão boas, seja para a qualidade ou para a economia, tudo tem sentido.
E regiões com climas mais difíceis, como Borgonha, Champagne, Piemonte, acabam ficando com menos uvas totalmente adaptadas ao seu clima. Outras mais “fáceis” como o Sul da França podem ter dezenas delas.
Enfim, o ponto que quero frisar com esse assunto é que, conhecendo a história do vinho nacional, vimos movimentos mais voltados ao marketing do que à qualidade. Tivemos muitos vinhedos da excelente Cabernet Franc que tinha se adaptado muito bem ao clima da Serra Gaúcha, replantados com a Merlot, da moda, do consultor famoso. Tivemos em Santa Catarina muitos testes da Epagri com uvas italianas, além de ótimos resultados com uvas brancas. E o que foi feito nas primeiras apostas? Muito Cabernet Sauvignon plantado nesse clima frio, uma uva que precisa de um longo ciclo de maturação, que se dá bem em pequenos cantos de Bordeaux ou na área desértica de clima mediterrânico do Chile, que nada tem em comum com o nosso.
Hoje esses produtores estão trocando essa pelas brancas e italianas que tiveram bom resultado no início, quem diria.
Quando vejo produtores plantando no mesmo local uvas que se dão bem na sua origem em terroirs totalmente opostos, extremos, me pergunto se, com tanta informação e história, por que continuamos fazendo isso?
Continuo achando que nossas melhores apostas são uvas de regiões com esses climas mais difíceis, resistentes à umidade, como Alvarinho, Loureiro, Sémillon e tintas como a Cabernet Franc. Lógico, achar essas variedades totalmente aptas pode levar tempo, mas começar a pensar nisso é importante, não só para a qualidade quanto para criar uma identidade e um estilo que poderemos nos destacar.
Mas, claro, essa é só a minha opinião.
Por Eduardo Machado Araujo
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Sobre o autor
Eduardo Machado Araujo
Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers
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