Do Oscar ao The Best em um Michelin, por André Vasconcelos
Um chef apaixonado pelo cinema e seus ícones revela conexões inesperadas entre filmes, pets e a cozinha
Estou certo que nem preciso falar muito do quanto gosto de cinema e seus ícones. Por anos comandei a cozinha do Muito Além do Jardim, um Bistrô que tem o nome em “versão brasileira por Herbert Richers” do filme americano “Being There”, estrelado por Peter Sellers no papel de um jardineiro.
Escolhi este nome pelo grande filme que é e o grande ator que o protagoniza… e pelos jardins que sempre rondam minha vida! Vários outros “filhos” foram batizados com alusões ao cinema, seus atores e seus personagens: a labradora Priscila, a rainha do deserto, com sua filha Lana Turner.
O Ian foi um grande cão que emprestou o nome do criador do 007, Ian Fleming… e Leonardo Dicaprio, um gigantesco buldogue americano que fez o papel de melhor amigo por anos! E já habitaram nosso quintal o Fred Astaire e a Rita Hayworth, um par de gansos mal-humorados.
Hoje Johnny Depp e Grace Kelly, um casal de daschund já com 15 anos, vivem no nosso jardim ao lado do Alfred Hitchcock, o nosso filho boxer branco. Aliás, como o seu homônimo, esse cão é genial e sensível, e nunca recebeu um Oscar, prêmio máximo do cinema americano! Hitchcock foi indicado seis vezes como diretor e mais uma como produtor, mas nunca levou a estatueta… só recebeu esse prêmio em uma homenagem por sua obra.
Um prêmio de consolação, o pior deles! Ainda terei um pet para batizar de Stanley Kubrick que também nunca recebeu um Oscar apesar de quatro indicações, inclusive pelo fantástico Dr. Fantástico (1964) com o não menos fantástico Peter Sellers. Qual a lógica do ator Charles Chaplin, do produtor Charles Chaplin, do diretor Charles Chaplin, do gênio Charles Chaplin e do inovador Charles Chaplin nunca ter recebido um Oscar?
O Oscar erra, com certeza por interesses maiores, como todos os prêmios erram. Na cozinha, assim como no cinema, existem prêmios, e no mundo, e no Brasil, os prêmios normalmente acabam em pizza, onde rola muito jabá, pura marmelada! E alguns prêmios são verdadeiros abacaxis, outros pepinos e na maioria deixam o sabor de jiló na boca de quem é de cozinha. Prêmios são prêmios, e os eleitos como “os melhores”, nem sempre são os melhores, afinal, nem sempre os que ganham são os que entram para história e nem sempre os que entram para história são os que ganham!
Quando falamos em melhores, para quem é de cozinha e gosta de boa cozinha, vem logo à cabeça a imagem de um livro de capa vermelha com suas estrelas! “Este Guia nasceu com o século e durará tanto quanto ele.” No começo do século essa frase dos irmãos André e Edouard Michelin pareceu um tanto pretensiosa, mas hoje, notamos que foi profética! A Paris de 1900 recebeu a Exposição Universal, uma mostra de tudo de mais moderno produzido no mundo.
Ali a Fábrica Michelin distribuiu gratuitamente seu primeiro Guia com informações dirigida aos motoristas, sobre uso e conserto de pneus, localização de postos de gasolina, locais para comer e dormir, além de mapas rodoviários e urbanos. A Michelin, na França com três mil veículos, visava incentivar o uso do automóvel, e com isso alavancar a venda de pneus. Em menos de dez anos o Guia da Michelin já circulava na Bélgica, Argélia e Tunísia, sempre com o mesmo propósito.
Hoje o Guia é referência mundial em gastronomia e está disponível em mais de trinta países, sempre evoluindo através dos anos independente das mudanças políticas e sociais, ou conceitos de moda! As estrelas do Guia Michelin surgiram em 1926 e cinco anos depois os níveis de uma, duas ou três estrelas valorizavam os bons endereços. Nesta mesma década surgiu o grupo de inspetores Michelin: profissionais de várias áreas, anônimos e funcionários da empresa, analisavam os endereços indicados.
No início da Segunda Guerra, os mapas do Guia eram alvo de estudo para as investidas contra Paris, e durante esse período deixou de ser publicado. Em 1944, depois de cinco anos sem circular, a última edição do Guia (1939) foi reimpressa com uma menção em sua capa: “somente para uso oficial”. Era o guia dos aliados em uma Europa de estradas destruídas e a única referência para a movimentação do exército era o Guia Michelin, e nele havia ressalvas informando a situação dos hotéis e restaurantes: uns destruídos, outros fechados.
A partir de 1977 há indicações de restaurantes com refeições de qualidade por um preço moderado, o Bib Gourmand, e em 2003 lançaram o Bib Hotel nos mesmos moldes para hospedagem. E desde 2019 premia também os restaurantes que investem na gastronomia sustentável e na proteção de recursos naturais: a Estrela Verde A avaliação do Guia Michelin tem como base cinco critérios: qualidade dos produtos, “personalidade” da cozinha do chef, domínio dos métodos de preparo e dos sabores, e a relação qualidade/preço, sendo que hoje as visitas são incógnitas e em alguns casos, por mais de um avaliador.
Devido à seriedade do Guia, restaurantes como o Fat Duck, Mugaritz e El bulli ficaram conhecidos internacionalmente por terem recebido estrelas e não receberam estrelas por serem conhecidos internacionalmente. Muitos prêmios criados nos moldes do Michelin, até mesmo no nosso universo tupiniquim, os critérios adotados estão longe de ter essa seriedade, serenidade e honestidade pois, na grande maioria das vezes, o voto é dado pela lembrança, pelo marketing ou pelos interesses políticos e pessoais dos organizadores e dos julgadores, que nem sempre são capacitados para tal avaliação, e quase nunca são imparciais.
Vivemos hoje em um mundo de prêmios onde, entre os eleitos como melhores chefs do mundo, esses mesmos chefs não aparecem em listas “the best” setorizadas criadas pela mesma organização que organizam o “the best” raiz! E como a grande maioria das premiações é pura encenação, viva Marlon Brando que enviou uma índia sioux recusar o prêmio que receberia como melhor ator por “O Poderoso Chefão”.
Segundo ele, era um protesto contra o tratamento dado aos índios americanos no cinema e na televisão. Mais tarde descobriram a índia que era uma atriz de carreira duvidosa que fez fama com o fato e posou para algumas revistas masculinas. Enfim, as premiações, na sua maioria, são pura encenação!
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Sobre o autor
André Vasconcelos
Cozinheiro raiz e autodidata, hoje no comando de sua Cozinha Singular Eventos e d'O Vilarejo Hospedaria e Gastronomia, onde insumos e técnicas são a base de cardápios originais e exclusivos... e aprendiz de escritor também!
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