Como Floripa pode virar Gramado?
A discussão sobre as relações entre turismo e mobilidade em Florianópolis não são de hoje. Desde a década de 1980 convivemos com fluxos muito superiores à capacidade de nossas vias. A duplicação da SC-401, o elevado do CIC, o elevado do Rio Tavares, o novo acesso ao sul, quando inaugurados, amenizaram a questão por um tempo – mas num tempo cada vez mais curto, tornaram-se novamente gargalos.
Florianópolis recebe, há muitos anos, milhões de turistas. Para as praias, os eventos, os negócios, as corridas, as trilhas, entre outros atrativos. Mas não temos a tradição de receber turistas para as atividades de Natal.
A discussão sobre fechamento de vias importantes – sobretudo a Beira-Mar Norte – já dominou as manchetes em algumas ocasiões – como no caso da Parada da Diversidade e das corridas (a pé ou de bicicleta - ambas criticadas, mas mais relevadas, pois, em geral, ocorrem cedo e antes do meio-dia a via já está desobstruída). Convencionou-se que tal via não pode ser fechada em horários de maior fluxo, como nos fins de semana.
Florianópolis ainda se baseia, em maior escala, num turismo de lazer baseado em atrativo e não em produto turístico – um amálgama de serviços, como transporte, hospedagem, entradas em atrativos, serviços de guiamento, alimentação, etc. Mas o grande fluxo de turistas vem por conta própria – e mesmo aqueles que compram via agências de viagens – compram eminentemente o trecho do transporte e a hospedagem. Porque nossos atrativos ou não custam nada – natureza – ou os serviços oferecidos não conseguem estabelecer relações com as operadoras de turismo – quem faz os pacotes – para se inserirem em tais pacotes. Raros são os turistas que conseguem comprar um pacote completo incluindo, por exemplo, visita guiada em fazendas de ostras – ou mesmo uma reserva num dos muitos restaurantes em que a ostra reina. Raros também são aqueles que compram antecipadamente, nos pacotes, bilhetes para atrações como travessia para a Ilha do Campeche, para a Costa da Lagoa ou ainda outras atividades. Isso explica, em parte, o porquê do gasto médio diário do turista ser baixo.
Na tentativa de transformar uma atividade de lazer da comunidade num atrativo turístico (para que, num segundo momento, ele possa estar num “pacote”, ou seja, se transformar num produto) foi que em 2021 e em 2022 a Prefeitura recriou o Desfile de Natal, com um diferencial: ele seria realizado na Praça XV de Novembro e na Ponte Hercílio Luz – uma coisa que só nós teríamos: artistas, música, luz, coreógrafos, cenografia de primeira qualidade numa ponte pênsil – aí está o diferencial. As imagens, belíssimas, do Desfile na Ponte, reverberaram nacionalmente. Em 2021 – e principalmente em 2022 – muita gente acompanhou os desfiles. O primeiro, como todo evento artístico em sua primeira edição – com algumas críticas quanto ao tempo (250 artistas na apresentação, com coreografias treinadas e ensaiadas e não andando apressados).
O segundo o problema foi a grande quantidade de pessoas – que – mesmo sendo possível assistir da Ponte, preferiram ficar na cabeceira insular. Na avaliação do evento, um fato: a necessidade de mais conforto para as famílias conseguirem enxergar melhor o desfile. Como opções, a colocação de arquibancadas móveis da cabeceira até a Felipe Schmidt, próximo ao Hotel Castelmar e um trabalho para organização das pessoas e a convidarem a ingressar nas passarelas da Ponte.
A opção da Prefeitura no desfile de 2023 foi a de fazer o evento na Beira-Mar Norte. Não mais na Ponte e nem na Praça XV. Não se discute a qualidade e, sim, a logística. As questões de conforto não foram resolvidas - além das pessoas reclamarem da falta de condições para assistirem aos desfiles (todos no mesmo plano), a principal crítica foi que a Beira-Mar Norte foi fechada para veículos – causando enormes engarrafamentos – salientando que milhares de pessoas estavam retornando das praias naquele dia. O esforço de comunicação foi tentado – mas em tempos de informação radial, achar que todos terão acesso à informação não é adequado.
Lamentamos a escolha do local para o espetáculo de 2023, pois vimos a desconstrução de um trabalho elaborado junto ao trade turístico, que utilizou a Ponte Hercílio Luz no Natal – sim, nosso diferencial. Desfiles de Natal, muitos fazem. Na nossa Ponte, fantástica, só a gente.
A tentativa de tornar o Natal um atrativo não só para moradores, mas também para turistas e as possibilidades de inserirmos tal atrativo, antecipando o calendário turístico da cidade, transformando o Desfile de Natal de Florianópolis no início oficial da temporada, vai ter que esperar mais alguns anos. A inserção de um atrativo como produto leva tempo, ate se transformar em realidade, se tornar perene e se tornar comercialmente interessante para as operadoras (vide o exemplo de Gramado).
“Sem liberdade de criticar, não existe elogio sincero". (Pierre Beaumarchais)
Texto escrito pot Vinicius De Luca Filho, Professor de Turismo do Instituto Federal de Santa Catarina. Foi superintendente de turismo de Florianópolis de 2017 a 2022.
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