As 5 mulheres que exercem mandato coletivo na Capital
Pela primeira vez na Câmara Municipal de Florianópolis, um grupo de cinco mulheres se elegeu em um mandato coletivo. Nesse caso, "coletiva", com “a”. O Coletiva Bem Viver (Psol) foi eleito com 1.660 votos e divide salário, gabinete e as decisões políticas. Marina Caixeta, Cíntia Mendonça, Mayne Goes, Joziléia Daniza Kaingang e Lívia Guilardi fazem história como coletivo, mas também por eleger duas mulheres negras e uma indígena numa Câmara que nunca foi ocupada por seus pares. Elas são as entrevistadas do Imagem da Ilha.
Confira:
1) Cinco vereadoras iniciaram seus mandatos em 1º de janeiro. É a maior bancada feminina da Câmara de Florianópolis nos últimos 85 anos. Juntas, vocês somaram mais de 11 mil votos. Quais fatores, na sua opinião, impulsionaram o voto em favor da mulher?
Durante a campanha, percebemos que mulheres estão cada vem mais inclinadas a votar em mulheres porque sentimos a necessidade de ter nossas pautas representadas. Estamos passando, de forma generalizada, por uma crise de confiança na política, que passa pela redução da confiança na representatividade masculina tal como está. Além disso, temos também outros fatores, como o fortalecimento de lideranças feministas nos partidos e nas comunidades, o crescente aumento da participação de mulheres na vida política e nas decisões públicas, que incentiva com que mais mulheres participem.
2) Apesar das diferenças político-partidárias, algumas questões comuns à mulher poderão unir a bancada feminina. De que forma a Câmara poderá colaborar na busca de soluções?
Pela primeira vez, quatro mandatos de mulheres ocupam a Comissão de Direitos das Mulheres e Igualdade de Gênero, com mais um vereador, o que já coloca as pautas caras às mulheres num patamar diferente, sem desmerecer o excelente trabalho desempenhado pelos vereadores na legislatura anterior. Nossa intenção é de assegurar que essa seja uma comissão de mérito, ou seja, que todas as matérias que afetam a vida das mulheres, como por exemplo educação, transporte público, saúde, passem por essa comissão. Estaremos unidas em momentos em que precisemos defender nossos direitos.
3) Casos de feminicídio e supostos estupros têm sido destaque no noticiário nos últimos tempos. Vocês se consideram "feministas"? Qual a importância do movimento nos dias atuais?
Somos feministas! Não há outra possibilidade que não seja ser feminista e levantar essa bandeira. Ser mulher ainda é uma condição que nos coloca em risco (de assédio, de estupro, de feminicídio) e nos desafia na sociedade. Ainda somos desmerecidas e questionadas em nossas habilidades e competências. Ainda estamos sujeitas a jornadas mais amplas de trabalho produtivo (emprego e estudo) e reprodutivo (cuidado com a casa e a família). Ainda recebemos salários menores do que os homens pela mesma função. Só conseguimos avançar no passado, e só conseguiremos avançar no futuro, por causa de mulheres feministas que lutaram e lutam pelos nossos direitos. Durante a pandemia, com o isolamento social e o aumento do tempo em casa, têm aumentado os casos de estupro, agressão e feminicídio. Isso nos mostra o tanto que ainda precisamos avançar em educação de gênero.
4) De maneira geral, qual sua expectativa para o segundo mandato do prefeito Gean Loureiro? Como será sua relação com o governo municipal?
Nosso partido (PSOL) e nosso mandato são de oposição ao Prefeito Gean e seu grupo político, o qual já mostrou ao que veio desde o início de janeiro, passando matérias que ferem o rito democrático, entregam patrimônio público municipal, retiram direitos dos servidores, desestruturam importantes órgãos de regulação, o desmonte a Comcap, entre outros ataques à população, ao meio ambiente e à democracia. Nós somos minoria na Câmara, mas faremos o possível para garantir os direitos da população de Florianópolis e da Natureza.
5) A Câmara tem sido alvo de críticas por reservar muito tempo a assuntos de menor relevância, como nomear ruas e criar datas, por exemplo. Alguma chance dessa realidade mudar nessa nova legislatura?
Temos buscado dialogar para ampliar a atuação da Câmara, ampliar o acesso da população àquele espaço, por meio das audiências públicas e das frentes parlamentares. Mas a casa possui 23 mandatos e está demasiadamente comprometida com o poder executivo; são 16 vereadores da base política do prefeito. Isso é determinante ao ritmo do legislativo, sobretudo porque a mesa diretora tem vínculos políticos com o executivo, e isso compromete a autonomia do parlamento e a isonomia entre os poderes.
6) No último dia 26/01, como vocês votaram no projeto de pacote emergencial enviado pelo prefeito Gean Loureiro (DEM) que alteraria os benefícios dos trabalhadores da Comcap? Explique seu posicionamento sobre o assunto.
Nós votamos contra todos os projetos do pacote emergencial do prefeito Gean Loureiro, por entendermos, em primeiro lugar, que a tramitação estava ferindo o rito legislativo, sendo, portanto inconstitucional, como denunciou o Ministério Público recentemente. Em relação ao projeto de lei que retirou direitos dos trabalhadores e alterou as competências da Comcap, abrindo caminhos para a terceirização dos serviços por ela prestados, fomos contrárias por serem direitos trabalhistas essenciais e necessários à dignidade dos servidores dessa Autarquia, e por entendermos que um serviço essencial e executado com excelência pela Comcap, deve continuar sendo exclusivo da mesma. Uma empresa pública com referência nacional não precisa ser desmontada, deve seguir sendo pública e eficiente.
7) Vocês formam o primeiro "mandato coletivo" da história da Câmara de Florianópolis, com cinco mulheres - duas delas negras e uma indígena. Como vai funcionar na prática? De que forma o cidadão poderá ser impactado positivamente por essa nova dinâmica?
Nossa Mandata Coletiva funciona com equidade e compartilhamento de tarefas. Cintia possui a tarefa representativa formal, dentro da Câmara, na tribuna e nas comissões, embora as demais acompanhem e auxiliem todo o processo. Nosso programa está dividido por áreas temáticas, nas quais nos separamos segundo afinidades e articulação política. Jozileia, liderança indígena Kaingang, é responsável com a nossa articulação com os povos indígenas do município, por exemplo. Dessa forma conseguimos ampliar as nossas possibilidades de contato com a população, ampliar nossa força de trabalho, e esperamos que assim a gente construa um mandato popular, aberto, participativo, representativo, com toda a força e a potência que cada uma de nós traz e representa.
Por Urbano Salles
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