00:00
21° | Nublado

'O Sal da Terra' traz toda essência de Sebastião Salgado
Documentário de Win Wemders e Julio Salgado mostra a grandeza do olhar deste imenso fotógrafo brasileiro que nos deixou no mês passado

'O Sal da Terra' traz toda essência de Sebastião Salgado
O documentário indicado ao Oscar em 2015, que retrata a vida e o olhar único de Sebastião Salgado sobre o mundo, está agora disponível na Globoplay e Prime Vídeo. (Foto: Divulgação)

Publicado em 25/06/2025

Se você não teve a oportunidade de assistir nos cinemas ao O Sal da Terra, documentário que concorreu ao Oscar (2015), pode agora – após 10 anos do seu lançamento – conferir no streaming. Está disponível na Globoplay e no Prime Video. É aquela oportunidade de absorver essa leitura única, sensível e grandiosa que Salgado exerceu mundo afora.

Coincidentemente, eu estava em Paris no dia e próxima ao local do seu falecimento. Foi agora, no mês passado, dia 23. E essa triste coincidência me fez lembrar de toda a sua trajetória, assim como do enredo marcante de O Sal da Terra. Era 1986 quando ouvi falar pela primeira vez em Sebastião Salgado. O fotógrafo brasileiro, que já acumulava experiências raras mundo afora – como a de ter documentado o atentado a tiros contra o presidente dos EUA, Ronald Reagan (1981) – estava lançando seu primeiro livro, o Outras Américas. Esta obra me deu naquela época uma narrativa visual nova, que eu absolutamente não conhecia. A amarga vida dos remanescentes de tribos indígenas na América Latina, a temática do livro, estava ali retratada em imagens de uma profundidade intensa, belas demais do ponto de vista estético, e tristes ao extremo, pela carga histórica que sustentavam. E é essa intensidade, que reside na beleza e no realismo sofrido dos povos, que potencializa o trabalho único e sensível do brasileiro Sebastião Salgado.

Essa antiga percepção foi revisitada, de forma mais abrangente, no filme documentário O Sal da Terra, produzido em 2014 e que teve sua estreia nacional em março de 2015. O trabalho, fruto do casamento do consagrado diretor alemão Win Wenders (de Paris, Texas/1984, Buena Vista Social Club/1999, Dias Perfeitos/2023 e tantos outros) e de Julio Salgado, filho e entusiasta do projeto, é um sucesso de crítica e de público. Público, que fique claro, que curte o formato documentário e que, acima de tudo, tenha afinidade com o trabalho de Sebastião Salgado. E também na direção incrível de Wenders, que exerce a essência da metalinguagem nesse trabalho, ou seja, uma arte (o cinema) que fala de outra arte (a fotografia).

 

O Sal da Terra e a fotografia que denuncia com beleza e dor.

 

O documentário é fácil de ver e de absorver o jeito de ser de Salgado. Com várias tomadas em preto e branco, que se entremeiam a fotos do artista e dele próprio trabalhando, a narrativa é feita ora por Wenders, ora por Salgado e, em boa parte, pelos próprios depoimentos contidos no documentário. A trajetória, desde a infância até a compra da primeira câmera e, consequentemente, das primeiras experiências como fotógrafo, apesar de organizada de forma cronológica, não é nem de longe maçante, como tinha tudo pra ser.

Aos poucos, vamos nos apaixonando pela história, pela importância da mulher de Salgado no rumo das coisas – a incrível e resiliente Lélia –, pelas viagens e desafios que ele atravessa. É impossível não se emocionar com as belas fotos de Mali, de Ruanda, de Serra Pelada e de tantos outros lugares que Salgado passou e registrou o sentimento de um povo como quase ninguém fez ou faz. Na luz do olhar de uma criança que foca o nada, na lágrima resplandecente de uma índia idosa que denuncia o passado duro, nas rugas cheias de esperança que cortam a pele castigada do garimpeiro. Residem ali a alma do trabalho de Sebastião Salgado e ela está desnuda nesse documentário.

Um particular: analisar o porquê do P&B, ou seja, da ausência de cor no trabalho. E Sebastião Salgado desenvolveu um conceito muito próprio sobre isso e, numa entrevista, disse que “o preto e branco elimina a distração da cor e faz com que você olhe diretamente para a alma da imagem”.

A verdade é que alguns críticos vão insistir na tese da “estetização da miséria”, atribuída a ele tantas vezes. Salgado se defendia dizendo que “fotografar o sofrimento com dignidade é uma forma de resistir à desumanização”. E concluía: “Eu não faço pornografia da dor”. Já outros críticos defendem a tese da luta de egos, pelo fato de ter se juntado num mesmo filme um ícone da direção cinematográfica e outro da fotografia, cada qual com seus propósitos. Eu já vejo esse documentário como uma rara oportunidade de conhecer o trabalho deste brasileiro cheio de talento, de histórias e que criou uma linguagem visual só dele. É uma espécie de homenagem pelo trabalho ao longo de 40 anos – não de fazer fotos simplesmente, mas de conseguir abrir nossos olhos para a questão social e ambiental em vários cantos do planeta. É merecido ele poder deixar seu legado nesse documentário que, por pouco mesmo, não levou a estatueta do Oscar 2015 como o Melhor Documentário.

Vale conferir.

 

Título original: Le Sel de La Terre
Direção: Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado
Roteiro: Wim Wenders, Juliano Ribeiro Salgado e David Rosier
Produção: David Rosier
Fotografia: Hugo Barbier e Juliano Ribeiro Salgado
Edição: Maxine Goedicke, Rob Myers
País: Brasil, França, Itália
Ano: 2014
Tempo: 110 minutos
Exibição na Globoplay e Prime Video

 

 

 

Para ler outras matérias da jornalista Karin Verzbickas clique AQUI

Para voltar à capa do Portal o (home) clique AQUI

Para receber nossas notícias, clique AQUI e faça parte do Grupo de WHATS do Imagem da Ilha.

Gostou deste conteúdo? Compartilhe utilizando um dos ícones abaixo!

Pode ser no seu Face, Twitter ou WhatsApp

Comentários via Whats: (48) 99162 8045


Sobre o autor

Karin Verzbickas

Karin Verzbickas

Jornalista conhecida por suas resenhas de filmes no Jornal Imagem da Ilha


Ver outros artigos escritos?