Andrino e a Lagoa – um antigo caso de Amor! Texto por Fernando Teixeira

Quem hoje circula pelas movimentadas ruas e avenidas do distrito da Lagoa da Conceição nem imagina que um dia aquele foi um local distante e de difícil acesso. Retratado de forma magistral nos versos do poeta Zininho, este pedaço encantado da Ilha de Santa Catarina guarda histórias e segredos que só seus moradores mais antigos ainda conseguem conservar em suas lembranças.
Local onde nasceu Edson Andrino e onde funcionava a venda da família Oliveira - Foto Fernando Teixeira.
Aos 79 anos, Edson Andrino de Oliveira, um dos mais conhecidos filhos da localidade, mantém-se visceralmente ligado às coisas que acontecem nesse lugar que o viu nascer, crescer e desenvolver-se. Andrino recorda que na infância não existiam estradas calçadas que ligassem aquela comunidade ao centro da cidade. Carroças puxadas por animais eram os veículos mais utilizados para vencer a “longa” distância que separava esses dois pontos do território ilhéu.
Foi numa dessas que fez suas primeiras viagens ao mercado público municipal, no intuito de comprar mercadorias que seriam revendidas no armazém da família, o primeiro a ser instalado pelas bandas da Lagoa. Ao contrário do que muitos imaginam, não era a pesca a atividade mais praticada na região. A produção de hortifrutigranjeiros tinha destaque na economia local. Frutas como melancia, abacate, banana, uva, jambo e café, além de verduras e legumes, eram produzidos em larga escala, e todo o excedente era comercializado, gerando renda aos inúmeros agricultores que ali se instalaram.
Pesca de tarrafa próximo a ponte que liga as duas partes da Lagoa - Foto Arquivo Edson Andrino.
Edson também faz questão de ressaltar a grande quantidade de engenhos existentes na Lagoa. Segundo ele, eram mais de dez espalhados pelo território, produzindo, sobretudo, a farinha de mandioca, que também era levada para ser comercializada nos armazéns do mercado público.
Ainda muito jovem, Andrino passou a frequentar o Colégio Catarinense, localizado no centro da capital. Queria mesmo era ser pescador, mas sua mãe, dona Ruth, que era professora, não abria mão de que os filhos estudassem a fim de que pudessem conquistar um futuro promissor. A precariedade das estradas existentes à época não permitia que retornasse todos os dias para a casa dos pais e a solução encontrada foi o internato existente na instituição.
Por ali permaneceu dois anos, sendo que mais tarde passou a se hospedar em casas de amigos, como as das famílias Filomeno e Amin. Nesse período o pai, Andrino Adrião, comprou seu primeiro caminhão. Conduzi-lo com segurança em dias de chuva, pelas perigosas curvas do morro do padre doutor, ou das sete voltas, como é conhecido, constituía-se uma tarefa bastante complicada. Era preciso colocar correntes em todos os rodados, a fim de evitar derrapagens e indesejáveis acidentes.
O primeiro caminhão comprado Por Andrino Adrião de Oliveira - Foto Arquivo Edson Andrino.
Mais tarde, já cursando Economia e Direito, concomitantemente, Edson ingressou no movimento estudantil. Eram tempos difíceis, de uma ditadura militar que havia se instalado no país. Chegou a ser preso algumas vezes. Lembra que em 1968, após ser detido num congresso da UNE em Ibiúna, interior de São Paulo, e de ter ficado trancafiado no presídio Tiradentes por alguns dias, foi trazido de volta a Florianópolis num desses caminhões de transporte de animais.
Fichado pelos órgãos de repressão, perdeu o emprego que o mantinha na cidade e que lhe proporcionava uma certa independência da família. Com a ajuda de um amigo, conseguiu instalar na Lagoa, num terreno de propriedade de seu pai, um pequeno posto de gasolina. Na época existiam somente cinco carros na localidade e muitos o chamavam de louco por tamanha ousadia.
Com essa atitude, Andrino parecia antever as profundas transformações que viriam a acontecer, não só naquela região do município, como em todo o território da Ilha de Santa Catarina. Recorda que nesse período praticamente não existiam casas comerciais e tampouco turistas em busca das belezas naturais da localidade. A Lagoa era frequentada somente por algumas famílias de Florianópolis, que, reconhecendo toda sua tranquilidade e sua singular beleza, ali instalavam suas residências de veraneio.
Os moradores locais costumavam construir suas habitações mais afastadas da orla, agrupados no pequeno núcleo urbano, sendo que aquele espaço era utilizado basicamente por pescadores para acomodação de seus pequenos ranchos de pesca.
Os primeiros colonizadores açorianos moravam afastados da orla da Lagoa- Foto Fernando Teixeira.
Já os moradores da Barra da Lagoa, quando precisavam se deslocar até a Intendência, a um posto médico, ou mesmo realizar uma visita a familiares, necessitavam fazer o percurso de canoa a remo, já que a estrada que ligava essas duas comunidades era extremamente precária.
A visão empreendedora da família Oliveira também fez brotar o primeiro estabelecimento gastronômico da região especializado em frutos do mar, o Dunas Bar e Restaurante, localizado às margens do caminho que levava às praias Mole e Joaquina. É possível afirmar que esse novo empreendimento pode ser considerado um marco decisivo para as mudanças que hoje verificamos nessa importante localidade da Ilha de Santa Catarina.
Mas isso é assunto que trataremos na próxima coluna. Até lá!
Andrino e seu irmão, em frente ao primeiro restaurante da família - O Dunas Bar e Restaurante - Foto Arquivo Edson Andrino.
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Sobre o autor

Fernando Teixeira
Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFSC), mestre em Geociências e Doutor em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), natural de Florianópolis. Atualmente tem se dedicado à fotografia.
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