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Uvas esquecidas que revelam seu brilho!

Em vinhedos esquecidos, uma nova geração de produtores redescobre o valor da Carignan, da Xarel·lo e da Meunier, com resultados surpreendentes. (Foto: Divulgação)

Publicado em 24/04/2025

Ao provar às cegas Champagnes de alto nível, uma figura se destacou repetidamente: Aurélien Lurquin, com seu raro cuvée 100% Meunier. Isso me fez refletir sobre como o mundo do vinho é muito mais do que está nos livros ou no que mandam as convenções regidas pelos grandes produtores.

Se você ler qualquer texto de escolas e livros sobre o tema verão a descrição que a Meunier (Pinot Meunier) sempre é tratada como o “trabalhador braçal” de Champagne, que está lá apenas para baratear custos e adicionar volume e fruta ao blend com as “nobres” Chardonnay e Pinot Noir, que trazem “elegância”, “longevidade” e “profundidade”.

Mas, ao provar alguns dos poucos produtores que valorizam essa uva como Lurquin, Egly-Ouriet ou Prevost, provamos alguns dos grandes Champagnes produzidos hoje em dia. Meunier é uma mutação natural da Pinot Noir de brotação e maturação precoce, resistente ao clima mais úmido e frio, tanto que se dá muito bem no Vale de la Marne onde ocupa mais de 70% dos vinhedos.

Com o surgimento de ‘growers’ que produzem seus próprios vinhos, cuvées 100% Meunier, muitos de vinhas centenárias, estão ganhando destaque. Alguns aproveitando vinhedos centenários espetaculares e perdendo a “vergonha” de apostar e estampar Meunier no rótulo, coisa que algumas casas omitiram recentemente. 

Os melhores, como o citado no começo desse texto, são champagnes ricos, vinosos, com um caleidoscópio de frutas, entre vermelhas, amarelas e tropicais, além de uma textura mineral incrível. Logicamente são Champagnes difíceis de achar, raros e caros, mas que valem o esforço e recompensam o paladar. 

De certa forma o mundo do vinho tem diversas uvas que se encaixam nesse papel de “patinho feio”. Assim como a Meunier, outras uvas coadjuvantes, como Xarel·lo e Carignan, estão saindo da sombra para brilhar em vinhos de personalidade. Normalmente relegadas ao papel secundário em blends locais, mas que cada vez aparecem como destaque em suas regiões.

A Xarel.lo por exemplo é uma uva branca escondida nos blends dos Cavas, principalmente na Catalunha, mas pequenos produtores locais, inclusive alguns que abandonaram a denominação Cava, têm produzido vinhos espumantes e tranquilos com essa linda variedade que traz acidez vibrante sem perder estrutura e longevidade, inclusive em estilos mais oxidativos produzidos em ânforas ou carvalho. Uma uva versátil que transparece o terroir de onde vem e adora a altitude e solos calcários do Alto Penedés. 

Produtores como Celler Pardas, Recaredo (Celler Credo) e Pepe Raventós têm feito um trabalho espetacular e surpreendente com a Xarel lo.

E por fim temos a Carignan, ou Cariñena como é chamada na Espanha, muito conhecida no sul da França no Languedoc-Roussillon e claro na Espanha ela é usada historicamente para adicionar cor, acidez e volume aos blends e sempre foi vista como uma variedade rústica e de baixa qualidade, principalmente pelos vinhedos de alta produtividade, mas os produtores que trabalham de forma mais natural as vinhas velhas, algumas com mais de 100 anos, tem alcançado um potencial incrível de qualidade.

Elas produzem vinhos intensos, de taninos rústicos, mas firmes, mas com acidez vibrante, trazendo além da fruta intensa notas de ervas secas, garrigue e notas animais. Mas, com manejo correto e menos extração pode ser surpreendentemente elegante e com ótimo potencial de guarda. Ela também se dá muito bem nos produtores do projeto Vigno no Chile que produzem vinhos com vinhedos de no mínimo 30 anos sem irrigação, nomes como De Martino e Morandé fazem vinhos muito especiais e Itata Paraíso tem um Carignan de vinhas centenárias incrível.

No sul da França, produtores como Domaine de Cébene, Pas de l'Escalette e Terroir al Limit no Priorato na Espanha são exemplos excelentes.

Essas uvas consideradas secundárias pelos especialistas e pela literatura mostram que nada é óbvio e que a nobreza é alcançada quando se trabalha de maneira séria e se valoriza o terroir e a herança natural de vinhas cuidadas com carinho por gerações. 

Às vezes é bom "esquecer" os livros e abrir a cabeça para novos sabores, experimente um Meunier, um Xarel·lo ou um Carignan. Essas uvas podem transformar sua próxima taça em uma descoberta inesquecível.

 

 

 

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Sobre o autor

Eduardo Machado Araujo

Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers


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