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“A cartomante” e “O relógio de ouro”: as faces do adultério na visão Machadiana

Nas narrativas machadianas, o patriarcado se revela na condenação de 'Rita' e na proteção de 'Luís Negreiros. (Foto: Divulgação)

Publicado em 16/08/2024

          O adultério é tema recorrente na obra machadiana e embora constante não segue o mesmo padrão de apresentação do ato se considerarmos o gênero apresentado pelo autor. A conduta feminina e masculina e homem traem de maneiras distintas se considerarmos as personagens “Rita” do conto “A cartomante” e “Luíz Negreiros” do conto “O relógio de ouro” de Machado de Assis. Olhando para os contos deste grande escritor brasileiro do século XIX, percebe-se nas atitudes das personagens: vileza em um e maquiagem em outro de acordo com as narrativas propostas. A Literatura revela o pensamento do grande gênio e seu posicionamento patriarcal. Entenda a palavra patriarcal a partir da autoridade masculina ao assinar duas obras literárias.   

          No conto “A cartomante” temos um tipo de adultério escancarado que se desdobra do começo ao fim: com nomes, encontros, sustos, medos etc. A personagem “Rita” entrega-se à paixão e à devassidão do ato adúltero enquanto “Luís Negreiros”, no conto “O relógio de ouro”, entrega-se à dúvida sobre a honestidade de sua esposa. Em “Rita” temos a confirmação do ato e dos fatos e em “Luíz Negreiros” temos o ato mascarado e os fatos encobertos. Nesse sentido, percebe-se o feminino entregue ao mais triste abandono pelo narrador que é verdadeiro algoz enquanto o masculino é amparado pela dúvida, e vestido de desconfianças, pois ele era o chefe da família.

          “Rita” encontra-se com Camilo, seu amante, e fala de seus medos: “— Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria...”. E não faltam descrições terríveis sobre o caráter da personagem: “Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolvendo-o, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado”. Há muita culpa e sedução nessa comparação com a “serpente”. Mas, a mesma descrição não se verifica no adultério de “Luíz Negreiros”, pelo contrário, parece mais vítima que adúltero quando interroga a mulher sobre um relógio de ouro que encontrou em seu quarto. “— Que é isto? disse ele, tirando do bolso o fatal relógio e apresentando-lho diante dos olhos. Que é isto? repetiu ele com voz de trovão. / Clarinha mordeu os beiços e não respondeu. Luís Negreiros esteve algum tempo com o relógio na mão e os olhos na mulher, [...]. O silêncio era profundo. Luís Negreiros foi o primeiro que o rompeu, atirando estrepitosamente o relógio ao chão, e dizendo em seguida à esposa:

          — Vamos, de quem é aquele relógio?”

          Machado de Assis não tem compaixão do leitor e segue toda a narrativa com essa investigação furiosa do personagem sobre o dono do relógio. Acontece que o relógio era um presente enviado por sua amante. É claro que ela não mandou pra casa dele, o entregador chegou ao escritório e ele já havia saído. Então, o entregador seguiu para a residência do destinatário.

          Assim, somente no final do conto ficamos sabendo da vileza do personagem. Nada sabemos de seus encontros e de seus amores clandestinos. Tudo, tudo, tudo encoberto e guardado. A “Iaiá” dele parecia mais um agente secreto.

          “Rita” é assassinada por “Vilela”, o marido traído. E o “Luís Negreiro” segue com as lágrimas da esposa, com a “Iaiá” e com o relógio de ouro. Esse Machado de Assis!...

 

 

 

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Sobre o autor

Luzia Almeida

Luzia Almeida é professora, escritora e mestra em Comunicação


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