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Kobra e Schweblin: arte e literatura muito além de pássaros, por Luzia Almeida

Com maestria e sensibilidade, a criação artística e literária nos fazem voar por cenários de emoção e reflexão. (Foto: Divulgação) ***CLIQUE PARA AMPLIAR FOTO

Publicado em 04/10/2024

Arte e literatura têm a força das cores e da emoção. Arte e literatura não sabem o que são grades. Nada poderá trancá-las porque como pássaros elas poderão voar da Itália à Argentina em voos que nos deixam perplexos e felizes com construções que notificam talento e inteligência e nos emocionam com o ineditismo de suas asas em construções metafóricas coloridas e urgentes.

          A arte de cores que o artista Eduardo Kobra manifestou na Itália apontou mais uma vez o seu talento. Foi em San Pietro Magisano na Calábria (Itália) que ele pintou Pavarotti na lateral da casa de uma idosa. Mas, pintar Pavarotti vai além de uma imagem: um tenor como Pavarotti precisa de algo mais explícito, mais expressivo para indicar que além de sua pessoa há uma voz encantada... Foi assim que a arte abraçou a metáfora na construção de pássaros saindo da boca do cantor. Quando perguntado pelos pássaros, Kobra disse “que são inspirados em espécies brasileiras e simbolizam seu legado, a sua música que até hoje ecoa, livre e bela, em todo o mundo”. É claro que o artista poderia usar notas musicais, mas não seria uma metáfora viva. Ele preferiu pássaros para indicar a qualidade do tenor, a vida do tenor; sua marca, sua identidade feito asas. O voo do artista na antiga Itália revela música e poesia. Uma orquestra para os olhos.

          Do mesmo modo fez Schweblin no que se refere à literatura: emoção que nos leva a nocaute como disse Julio Cortázar “no embate que se trava entre um texto apaixonante e o leitor, o romance ganha sempre por pontos, enquanto o conto deve vencer por nocaute”. Exatamente! O conto “Pássaros na boca” de Samanta Schweblin afeta nossos sentidos e nos deixa completamente desamparados diante de uma metáfora em forma de pássaros. A personagem Silvia sofreu ao descobrir o alimento que sua filha preferia e não teve como esconder isso do ex-marido: “Sua filha tem sérios problemas. Você vai dizer que estou exagerando, que sou uma louca, todo esse papo, porém não temos tempo para isso. Venha até minha casa agora mesmo e vai ver com seus próprios olhos”.

          Ela estava sofrendo e precisava compartilhar o sofrimento com o pai da garota. Questões familiares... quem não têm?!... O problema de Silvia era referente à estranha alimentação da filha: “Quando Sara se virou para nós o pássaro tinha sumido. Sua boca, o nariz, o queixo e as duas mãos estavam cheios de sangue”. Foi depois desta demonstração que Sílvia entregou a filha ao ex-marido. Mas, esse problema da personagem é uma metáfora e o leitor vai se identificar com a situação do personagem Martín e vai entendê-lo quando ele raciocina: “Pensei em coisas acerca de pessoas que comem pessoas, então comer pássaros vivos não pareceu tão ruim. E também que, num ponto de vista natureba, era mais saudável que usar drogas, e, do ponto de vista social, mais fácil de disfarçar que uma gravidez aos treze”. O modo como ele maquia o problema é tão doloroso que não conseguimos fechar o livro e seguir para o próximo conto... ficamos com ele, concordamos com ele e também sofremos com esta ficção de nocaute que, embora lona, deleite!...

          A arte do Kobra e a literatura da Schweblin concedem-nos momentos de prazer e de reflexão quando temos os sentidos despertados pelo belo e ficamos assim... com água na boca diante da arquitetura das cores e das palavras.

 

 

 

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Sobre o autor

Luzia Almeida

Luzia Almeida é professora, escritora e mestra em Comunicação


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