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Beatriz Souza e a medalha no caminho, por Luzia Almeida

Ouro pode significar coisas diferentes para pessoas distintas: para um garimpeiro, um atleta olímpico, um rico ou um pobre. (Foto: Jean Catuffe/Getty Images)

Publicado em 09/08/2024

          O que é ouro? Por incrível que pareça, ouro não é a mesma coisa pra todos. Querem ver? Ouro pra garimpeiro é diferente de ouro para atleta olímpico. Ouro para rico é diferente de ouro para pobre. Mas, quando se fala em ouro olímpico entendemos que é um tipo de ouro simbólico que pertence a todos de uma mesma nação ganhadora cujo atleta e o planeta assistem à elevação da sua bandeira e ouve o hino de sua pátria. Ouro, de acordo com o dicionário, “é um elemento químico com símbolo Au (do latim aurum ‘ouro’) e número atômico 79. É um metal brilhante, levemente amare-lo alaranjado, denso, macio, maleável e dúctil na sua forma pura”. Esta definição é pura teoria sem nenhuma raiz de emoção se pensarmos no ouro da judoca e campeã olímpica Beatriz Souza.

          O ouro da Beatriz Souza é mais amarelo e mais valioso por conta do sorriso dela; por conta de sua competência e força de vencedora. É um tipo de ouro valorizado não por sua pureza própria, mas pelo brilho da dona. Valorização que brilha mais que o sol ao meio dia e consegue dourar mais de 215,3 milhões de pessoas.

          Mas, há outros ouros como o de “Tubiacanga” que passa longe de Paris. De acordo com o conto “A nova Califórnia” de Lima Barreto, o personagem Raimundo Flamel diz que pode fazer ouro e isso não é para qualquer um:

          “— Imagine o senhor que se trata de fazer ouro...

           — Como? O quê? — fez Bastos arregalando os olhos...

           — Sim! Ouro! — disse com firmeza Flamel.

           — Como?

          — O senhor saberá — disse o químico secamente. — A questão do momento são as pessoas que devem assistir à experiência, não acha?

          A Literatura tem o poder de revelar caracteres. O ouro prometido por Flamel era um espelho que revelava o caráter de cada morador de “Tubiacanga” e essa metáfora é tão verdadeira — ouro é espelho — quanto mais intenso for o brilho do metal e a cobiça dos moradores. O ouro é um poderoso símbolo de dominação e a conquista legítima dele pode deixar o adversário de costas no chão, como se percebe numa luta de judô. Mas fazer ouro? Isso pode acontece no tatame e não é nada fácil. É uma luta!...

          Atletas aspiram ao pódio e treinam durante anos para participar de uma olimpíada e a conquista de uma medalha, ainda que individual, é sempre coletiva porque o atleta representa um país, uma bandeira, um hino e a emoção da vitória é compartilhada por todos. Isso é muito lindo!...

          Quanto a judoca Beatriz Souza, ela tinha uma medalha dourada no meio do seu caminho, talvez até tivesse sonhado com ela como um menino sonha ser astronauta, como uma menina sonha ser bailarina (“Esta menina tão pequenina / quer ser bailarina”). Uma medalha de ouro, ainda que pendurada, tem alicerces solidamente firmados na história da atleta. Ela nunca se esquecerá desse momento solene de que foi capaz: arrebentar o lacre e libertar as notas musicais do hino nacional brasileiro e todos “Ouviram do Ipiranga...” e o próprio Sena parou para ver o verde-amarelo subindo...

          Foi Lispector que disse: “Cuide-se como se você fosse de ouro, ponha-se você mesmo de vez em quanto numa redoma e poupe-se”, mas a Bia não se cuidou, resistiu à redoma e se expôs de modo tremendo mesmo sendo de ouro. Ela não se poupou, havia o risco do wazari e do ippon, mas não havia uma queda “no meio do caminho”, havia uma notícia mundial que uma lágrima feliz anunciava do lugar mais alto.

 

 

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Sobre o autor

Luzia Almeida

Luzia Almeida é professora, escritora e mestra em Comunicação


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