00:00
21° | Nublado

SC do futuro: uma forte classe média

As conquistas dos países europeus e do seu estado do bem-estar social, no pós-guerra, o desejado “welfare state”, tiveram como racional a formação de uma robusta classe média lastreada em educação, produtividade e acesso ao consumo de massa (Foto: Reprodução/Internet) **Clique para ampliar

Publicado em 25/10/2022

Neste domingo, 30, mais de 5 milhões de catarinenses vão voltar às urnas para o que - se espera - seja mais um espetáculo de Democracia. Por isso, na coluna de hoje, vamos ao cerne de uma questão fundamental para esta série sobre Propostas e Metas sobre a Santa Catarina do futuro, algo que deveria ser central em qualquer plano de governo: o objetivo de sermos um país e um Estado majoritariamente de classe média.

Este objetivo significa um dos alicerces da estabilidade política, paz e prosperidade das democracias ocidentais, mas nunca foi uma meta central, explícita e moral da nossa sociedade, dos partidos, dos políticos e das classes dominantes brasileiras à esquerda e à direita; ainda não passa perto de ser uma ideia-força de base para o país, nem para SC.

Mesmo assim, cabe aqui ressaltar, mais uma vez, que a construção do nosso Estado, desde a chegada dos colonizadores, na segunda parte do século 19, teve como traço fundamental um maior equilibro entre as regiões e as cidades, uma boa distribuição demográfica e também de atividades econômicas e educacionais – fazendo com aqui se criasse uma classe média diferenciada, o que diminuiu as desigualdades sociais. Mas SC é uma exceção à regra da maioria dos estados da Federação.   

As conquistas dos países europeus e do seu estado do bem-estar social, no pós-guerra, o desejado “welfare state”, tiveram como racional a formação de uma robusta classe média lastreada em educação, produtividade e acesso ao consumo de massa. Sobretudo nos EUA, o ideal das classes médias se confunde com a essência do sonho americano, o “American Dream”, hoje radicalmente dividido e fragilizado pela queda da mobilidade social e consequente encolhimento das classes médias. Na própria Declaração de Independência norte-americana, em 1776, é assegurado não apenas o direito à vida e à liberdade, mas à busca da felicidade (“pursuit of happiness”).

Neste século, a ascensão econômica do Canadá, Austrália, Nova Zelândia, e com o tempo, dos tigres asiáticos Japão, Coréia do Sul e Taiwan estão baseados em seus modelos de classe média. Até mesmo a China, com o capitalismo de estado liderado por Xi Jinping, em seu megaprojeto de país declara como prioridade “transformar a China em um país de classe média, com crescente acesso ao consumo serviços públicos e bens culturais”.

De volta à América Latina, uma boa parcela da esquerda, mais antiquada e estereotipada em seu stalinismo, trotskismo ou gramcismo, ainda olha de forma enviesada para o desenvolvimento de uma genuína classe média como uma “incubadora da burguesia”; a direita mais rústica raciocina em um simplismo darwinista-social do tipo “se não chegou à ascensão social é porque não tem competência”, sem a mínima noção do sentido que deu Tocqueville à equidade e à igualdade de oportunidades no seminal “Democracia na América” e do processo de afluência coletiva que é possível a partir de um processo de desenvolvimento equilibrado, com modernização política e econômica.

De fato, a formação de um país de classe média não é um desafio banal, pois requer compromissos e princípios públicos fortes, alta capacidade de negociação e pactuação pela construção gradativa de amplos aumentos de oportunidades e produtividade.

Ainda assim, talvez pela estreiteza de entendimento de alguns segmentos políticos e sociais, as reformas e avanços institucionais que podem nos levar a um ganho de produtividade, oportunidades e maior afluência social é interpretado como “sacrifício”, e não como um projeto democrático de país.

O mercado de consumo de bens mais sofisticados nos países desenvolvidos se deu somente após o atingimento de padrões básicos de “consumo de massa” e de bens culturais. Sendo assim, dificilmente uma família de classe média alemã ou japonesa compraria mais uma televisão, ou automóvel ao obter um aumento de renda – como comumente acontece no Brasil. Por já encontrar seu equilíbrio e se encontrar em países com economia mais estável, podem, então, gastar em viagens, lazer, cultura, além da sua educação e dos filhos, e poupar.

Os brasileiros, obviamente, ainda estão longe de atingir este estágio. Na realidade, boa parte da população que constituiria a chamada “classe média” seriam as famílias com renda acima de 20 salários-mínimos mensais, que equivalem às classes medianas europeias e norte-americanas em poder aquisitivo bruto, mas que no Brasil já fazem parte de nossa “classe média-alta”, ou quase alta, ainda que, na prática, estejam muito distantes da classe alta em padrão global.

No entanto, a questão do consumo e da classe média no Brasil vai muito além de um comportamento mais moderado de economia doméstica.

Um ponto vital é que os bens de consumo disponíveis à classe trabalhadora e média brasileira são extremamente caros, majorados por custos sistêmicos, impostos e juros que se transformam em bolas de neve de endividamento. Nessa questão, a se somar a relativa baixa remuneração tanto da classe trabalhadora quanto da suposta classe média, o preço relativo dos bens pode chegar a cinco ou seis vezes ao de um consumido em país desenvolvido.

Desta forma, a renda disponível do brasileiro de classe média, em famílias com renda de 5 a 15 salários-mínimos, após custos financeiros e impostos, é bastante baixa. A combinação de preços altos de produtos com salários e ganhos baixos são cruéis jabuticabas envenenadas que vicejam no Brasil que deixou de lado a meta central de formação de uma verdadeira classe média para o seu sucesso civilizatório.

A produção e a produtividade dos brasileiros são cercadas de ineficiências do custo Brasil. O resultado de boa parte do esforço dos brasileiros acaba nas mãos do setor público, do setor financeiro e de grandes grupos privados (oligopólios) que formam preços. Poupança interna e investimentos gravitam uma taxa relativamente baixa, de 18%, quando o razoável seria de, pelo menos, 25%. Daí buscarmos a poupança externa com frequência e nos depararmos com outro problema: grande parte dos investidores internacionais evita se submeter à complexidade de um país que resiste em evoluir institucionalmente.

A formação de um mercado consumidor interno robusto depende do fortalecimento da classe média e da classe trabalhadora. E isso se dá quando passam a ter real poder aquisitivo a partir de ganho de produtividade, aumento real do nível de remuneração, redução do custo financeiro e de impostos.

O Brasil afirma ainda mais suas idiossincrasias ao exaltar a informalidade, enquanto esconde o seu conservadorismo e imobilismo, por vezes de forma até mesmo inconsciente. A formação de uma verdadeira classe média forte deve ser um destino manifesto do Brasil, com benefícios econômicos, sociais e políticos sem precedentes. E em torno disso devemos nos estruturar e mobilizar.

Quem sabe já a partir de semana que vem, com os novos governos e parlamentos eleitos, o objetivo de termos uma robusta classe média suba para o topo da pauta e deixe de ser apenas um ideal, para se transformar numa ideia-força e um projeto para o país e para Santa Catarina.  

Da redação

 

Para receber notícias, clique AQUI e faça parte do Grupo de WHATS do Imagem da Ilha.

Gostou deste conteúdo? Compartilhe utilizando um dos ícones abaixo!
Pode ser no seu Face, Twitter ou WhatsApp!

Para mais notícias, clique AQUI


Sobre o autor

Vinicius Lummertz

Secretário de Turismo e Viagens do Estado de São Paulo


Ver outros artigos escritos?