Quem lê tanta notícia?
Pesquisa mostra o novo retrato de quem busca notícias no Brasil
Caetano Veloso, quando ainda caminhava por aí sem lenço e sem documento e compôs em 1967 a modernista “Alegria, Alegria”, já questionava de forma angustiada: “quem lê tanta notícia?”. A pergunta, que na época denunciava nas entrelinhas o baixo nível de educação do brasileiro e o alto grau de alienação política – estamos falando dos anos de chumbo – só não é mais atual porque o baiano não previu a revolução que a internet e a forte aderência global às redes sociais fariam no mercado da comunicação.
De lá para cá, uma verdadeira disrupção é vivida na forma como as pessoas se informam e onde buscam a informação. Uma pesquisa realizada pelo Ibope, a pedido da Secretaria da Comunicação da Presidência da República, mostra um novo retrato dos leitores de notícias no Brasil. Nada menos que 92% da população brasileira já se conectou, em algum momento da vida, à internet. Destes, 76% acessam a rede todos os dias e por lá permanecem em média quatro horas e meia. E o que a maioria faz nesse tempo todo? Mais de 67% buscam notícias.
O mais interessante é ver que o meio digital é a principal e praticamente a única ferramenta de busca por informação dos internautas brasileiros. Neste público fiel às redes digitais, apenas 7% leem um jornal impresso diário, 76% não leem nunca e 21% dizem ler uma única vez na semana.
Não é à toa que os jornais impressos diários agonizam nesse mundo cada vez mais digital. Se vão ser exterminados nessa nova onda, ninguém ainda sabe dizer com precisão. Há quem diga que é só uma questão de tempo, e há os especialistas que garantem haver espaço para todas as mídias, assim como o rádio não morreu com o advento da televisão. O fato é que a briga é grande e as conseqüências no mercado de comunicação são profundas e irreversíveis.
Depois de o Brasil perder dezenas de jornais impressos importantes – quem aí se lembra da Gazeta Mercantil, Jornal da Tarde, O Sul, Diário do Povo, Jornal do Brasil, Diário do Comércio, O Estado do Paraná ou do Brasil Econômico? - foram inúmeros os títulos de revistas impressas que simplesmente sumiram das bancas. Quem não morreu, teve que se readaptar, cortar cadernos, diminuir número de páginas editoriais e encontrar ao mesmo tempo uma forma de se apresentar no mundo digital. Pode-se dizer que esse desafio ainda não foi vencido por nenhum grande grupo de comunicação, seja no Brasil ou no exterior. Todos ainda buscam uma forma de repor suas receitas publicitárias no ambiente on-line.
Não há dúvida que a fatia do bolo publicitário vem aumentando para o ambiente digital, mas é ainda insuficiente para reposicionar os veículos e fazê-los sobreviver nesse mar de incertezas. A verdade é que ninguém achou a forma ideal de fazer dinheiro oferecendo notícias na internet. O que mais tem se aproximado disso é o paywall - sistema de assinatura que permite ao internauta o acesso a conteúdos restritos, o chamado “muro de pagamento”. Segundo o Observatório da Imprensa esse é o único mecanismo que tem se mostrado mais eficiente na venda de assinaturas digitais.
O fato é que o próprio consumidor de notícias digitais, ainda que em número bastante superior ao leitor de notícias impressas, rejeita parcialmente essa nova fórmula. Tanto é que 52% dos leitores de veículos impressos acreditam naquilo que leem. Essa credibilidade despenca para 27% quando a fonte é um veículo digital (jornal on-line, blogs e sites). Ou seja, a maioria está lá, mas não acredita muito no que lê mesmo dedicando quase cinco horas do seu dia nisso.
Outra razão do insucesso desta migração do off para o on é que os veículos de comunicação de massa têm imensa dificuldade de imprimir sua marca digital. O público já confunde fonte com plataforma. Um estudo realizado pelo Instituto Reuters (50 mil pessoas entrevistadas em 26 países) mostra que quando se pergunta a um internauta sobre onde ele viu determinada notícia, a resposta é geralmente: no Facebook. Ou seja, de plataforma onde se descobre as notícias, o Facebook se transformou no próprio veículo de comunicação.
Enquanto isso, permanece o desafio dos veículos que viraram on-line: fazer o internauta clicar na notícia e entrar na sua página (geralmente ele não vai, lê só o título da notícia e se dá por satisfeito). E quando ele ultrapasssa essa barreira, há outros dois gols difíceis de marcar: primeiro, evitar que ele bloqueie a publicidade e, segundo, fazê-lo assinar e pagar pela notícia que está lendo.
No Brasil, essa mudança de comportamento do leitor brasileiro não causou só fechamento de jornais e revistas, mas também uma demissão em massa de jornalistas sem precedentes na história recente do país. Um levantamento da agência independente de jornalismo Volt Data Lab, mostra que entre 2012 e final de 2015 foram demitidos mais de 5 mil jornalistas e profissionais de comunicação em todo o Brasil. Pelo site, que mostra um panorama completo que eles chamam sugestivamente de “A Conta do Passaralho” é possível acessar por jornal ou editora o número de demitidos (http://passaralhos.voltdata.info).
Por trás do fechamento de veículos de comunicação e da demissão em massa de jornalistas está o que ninguém queria ver: a queda livre da qualidade na produção de notícias. Nossa torcida é para que empresas e profissionais de comunicação encontrem mecanismos de sobrevivência na era digital e possam, a partir de uma nova plataforma, exercer o bom e velho jornalismo de credibilidade com alto índice de audiência. Alegria, alegria!