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Presépio da Praça XV – tradição e beleza no coração da cidade, por Fernando Teixeira

Presépio da Praça XV – tradição que já dura 50 anos. (Foto: Fernando Teixeira)

Publicado em 11/12/2024

Para vivermos verdadeiramente uma cidade é necessário, muitas vezes, sairmos do lugar comum em que nos encontramos. Ao nos desprendermos da rotina entediante do dia a dia, percorrendo com curiosidade, admiração, ou mesmo perplexidade, suas diversas paisagens e seus enigmáticos recantos, deixando-nos envolver por seus mistérios e pelo que há de mais surpreendente a cada passo que damos em direção ao desconhecido, ampliamos os laços que fortalecem nosso sentido de pertencimento ao sítio em que nascemos ou escolhemos para viver.

 

Ruas da cidade à espera do Natal. (Foto: Fernando Teixeira)

 

Nestes dias iluminados de um quase verão, se nos dispusermos a um despretensioso passeio pelas ruas centrais de Florianópolis, certamente iremos nos deparar com um cenário de rara beleza e encantamento. No Jardim da cidade, como gostavam de se referir à Praça XV os antigos moradores desta Ilha Catarina, a iluminada cena que nos faz recordar e entender o verdadeiro sentido do Natal está ali, lindamente representada num encantador Presépio.

Neste ano ele completa 50 anos desde que foi trazido da UFSC para este recanto que nos remete às origens da antiga Desterro. Originalmente concebido pela mente privilegiada do mestre Franklin Cascaes, tendo ao lado seu maior discípulo, o museólogo e a(Peninha), tinha como proposta resgatar, com simplicidade, mas com muita criatividade, onascimento de Cristo, utilizando para isso elementos vivos da cultura portuguesa/açoriana.

Desde sua primeira edição em 1973, vem sendo elaborado com materiais encontrados nanatureza, acrescido de peças produzidas por artesãos,como oleiros, rendeiras ou fazedores de tarrafas, atividades ainda presentes na Ilha de Santa Catarina, ou em sua região circunvizinha.

 

Peças de oleiros, rendeiras e pescadores - um toque original ao presépio da Praça XV. (Foto: Fernando Teixeira)

 

Em 1993, o artista Jone Araújo recebeu do amigo Peninha a incumbência de dar prosseguimento à montagem dessa singular obra da arte tropicalista brasileira. O multifacetado artista, nascido em Morro da Fumaça, Sul de Santa Catarina, mas que desde os 11 anos passou a residir em Florianópolis, acostumado com pinturas, esculturas, concursos de fotografias e de fantasias de carnaval, viu-se diante de um novo desafio - dar sequência a um trabalho que havia se tornado símbolo das festividades natalinas da capital catarinense. 

 

Jone Cezar Araujo – artista escolhido por Peninha para continuar a arte de Cascaes. (Foto: Jeferson Costa)

Da infância trouxe lúdicas experiências em trabalhos feitos com o barro, material fartamente
encontrado em sua terra natal. Ainda criança, aprendera com tias e primas mais velhas a confeccionar as próprias imagens que serviriam para ornamentar os presépios montados na casa da avó, localizada na cidade de Tubarão.

A primeira lição que ouviu dos lábios de Peninha, ao lhe dizer que pouco conhecia sobre presépios e que esta seria uma das tarefas mais desafiadoras de sua vida, foi de que era preciso conhecer a certidão de nascimento de Jesus. O mestre o aconselhou então a ler os evangelhos e deles retirar a essência de uma das cenas bíblicas mais conhecidas por toda a humanidade. Utilizando peças produzidas por Cascaes, Peninha, Valdir Agostinho e outros, Jone Araújo confeccionou seu primeiro presépio na Praça XV de Novembro, ao final do ano de 1994, mantendo as características iniciais utilizadas por seus precursores. A vontade de fazer mais e melhor o levou a pesquisar e se aprofundar nessa arte em países da Europa e até mesmo em Israel, local que considera o princípio de tudo.

 

O colorido da decoração natalina contrasta com a arquitetura histórica. (Foto: Fernando Teixeira)

 

O reconhecimento do trabalho realizado ao longo dos anos foi sendo materializado não só pelos inúmeros elogios recebidos por aqui, mas sobretudo por premiações obtidas em participações em concursos desenvolvidos mundo afora. Em 2016, por exemplo, o artista e o conjunto da obra histórica do Presépio foram agraciados na Europa com a Medalha de Honra ao Mérito, concedida pela Federação Universal de Presepistas, por sua grande beleza e originalidade. Jone, que já elaborou mais de 500 presépios, afirma que eles são um pequeno vislumbre do maior acontecimento da humanidade – o nascimento de um Deus que vem para dizer que podemos ser melhores, fazer melhor. Para ele, esse é o verdadeiro valor em celebrarmos o nascimento do Salvador.

 

Natal - tempo de reflexão. (Foto: Fernando Teixeira)

 

Neste ano, relembrando a fase ceramista de Franklin Cascaes, o artista e sua equipe trazem à praça XV de Novembro a montagem de um presépio que mantém, além de características utilizadas nos primeiros exemplares vistos na década de 1970, rostos e mãos confeccionadas em barro, algo que proporciona ainda mais beleza ao conjunto disponibilizado à visitação.

Aquele menino vindo do Sul, que, quando aqui chegou logo se apaixonou pela Ilha de Santa Catarina, fugia de casa para ver de perto a grande ponte que a ligava ao resto do mundo, brincava com sobras de decoração carnavalesca para criar suas primeiras obras de arte e logo mostraria todo seu potencial através do SAARTE – Salão de Artes do Instituto Estadual de Educação - , estava predestinado a nos brindar com suas importantes criações.

Ele nos ensina que é preciso sair do lugar comum, romper as barreiras do desconhecido para encontrar um mundo novo, repleto de possibilidades. Uma visita ao Presépio da Praça XV de Novembro ou ao Centro Cultural do Continente, onde acontece uma mostra de presépios confeccionados por diversos presepistas do Estado, é uma boa oportunidade para conhecermos um pouco mais o que a cidade nos tem a oferecer. Que tal nos deixarmos surpreender por seus encantos? Que tal fazermos do nosso Natal um momento de reencontro com as coisas que realmente importam? Feliz Renascimento! Feliz 2025!

 

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Sobre o autor

Fernando Teixeira

Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFSC), mestre em Geociências e Doutor em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), natural de Florianópolis. Atualmente tem se dedicado à fotografia.


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