Mauri - entre pizzas e amigos, uma história marcada pela gentileza, por Fernando Teixeira
Assim como em muitas outras comunidades da Ilha de Santa Catarina, na pacata Santo Antônio de Lisboa dos anos de 1950, a vida transcorria de forma simples, sem esses atropelos a que estamos acostumados nestes tempos de agora. Brincar entre os ranchos de pescadores e seus encantadores apetrechos, empinar uma pipa, ou “bater uma bolinha” até o dia escurecer, num terreno qualquer transformado em campo de futebol, era diversão garantida para a meninada do local. Nesse cenário bucólico, mas carregado de muita história, nasceu e cresceu Mauri José da Luz, uma figura marcante, que a todos encanta pelo carisma e extrema capacidade de agregar os que dele se aproximam.
Santo Antônio de Lisboa – onde tudo começou (Foto: Fernando Teixeira)
Quando criança, era frequente vir à cidade com o pai, trazendo na embarcação de sua propriedade o resultado da pesca que seria comercializada no Mercado Público de Florianópolis. Desse tempo, guarda na memória o encantamento de cruzar as límpidas águas da baía norte até avistar a ilha do carvão, antes de aportar onde hoje se encontra instalado o “exótico” camelódromo municipal. Ali, enquanto aguardava o retorno de Seu Manoel, que sempre saía para vender seus produtos e comprar combustível para o barco no posto localizado lá pelas bandas do Rita Maria, o menino vindo do interior da ilha observava atento os casarios da Francisco Tolentino e toda a movimentação comercial, característica marcante da antiga região portuária da cidade.
O mar e a Francisco Tolentino – local em que seu Manoel deixava sua baleeira. (Foto: Casa da Memória de Florianópolis)
Mais tarde, ao frequentar a então Escola Industrial, hoje IFSC, Mauri aproveitava sua vinda diária ao centro da capital para conhecer melhor aquela região que sempre visitava quando criança. A movimentação das coloridas embarcações, o frenético desembarque de mercadorias, o antigo Miramar e seus frequentadores, os carros de praça, o movimentado trânsito de veículos na Conselheiro Mafra e Felipe Schmidt, ou os remadores com seus elegantes barcos de competição, estão ainda guardados, com certo saudosismo, em sua privilegiada memória.
Vista do Miramar a partir do trapiche do Mercado Municipal.(Foto: Casa da Memória de Florianópolis)
Aos 17 anos, Mauri foi tentar a vida em Santos, litoral de São Paulo. Por lá permaneceu alguns anos, sempre trabalhando no ramo de alimentação. Mas Florianópolis era mesmo seu berço e seu destino. Em 1980, a Avenida Rio Branco, uma das últimas vias a contribuir para a consolidação definitiva da estrutura urbana da região central da capital, possuindo características, à época, muito mais residenciais do que comerciais - ao contrário do que verificamos hoje - viu surgir, através do espírito empreendedor de Mauri, uma das primeiras pizzarias da cidade, a Lisboeta. Pouco tempo antes, ele havia tido na mesma avenida uma padaria. Famílias tradicionais de Florianópolis, que residiam nas imediações, como os Piazza, Carione, Prado, Becker, Sales, Cascaes, Bitencourt, entre outras, foram se transformando, aos poucos, além de clientes, em verdadeiros amigos. A empatia e a grande facilidade de reunir pessoas ao seu redor fizeram com que a Lisboeta também se transformasse num verdadeiro espaço de confraternização dos florianopolitanos.
A Pizzaria Lisboeta – anos 1980 - muitas histórias à contar. (Foto: Arquivo pessoal - Mauri José da Luz)
A receptividade e o carinho com que o proprietário recebia seus clientes, o ambiente descontraído, aliados à qualidade de suas pizzas, logo transformariam aquele novo estabelecimento num caso de sucesso. E assim permaneceu no local até 1994. Nessa mesma década, Mauri, em conjunto com um sócio, abriu a San Francesco. Localizada na Rua São Francisco, na região central da capital, a nova pizzaria acabaria logo sendo reconhecida, não só pela excelência de seus produtos, mas sobretudo por continuar mantendo os antigos laços de amizade construídos há quase duas décadas, além de estabelecer novas e duradouras relações que ali foram sendo construídas. Reuniões familiares, confraternizações, encontros de negócios, bate-papos alegres e descontraídos em torno do balcão, inícios de muitos namoros e até festas de casamento, foram momentos significativos que marcaram a trajetória desse importante ícone da gastronomia italiana em Florianópolis.
Avenida Rio Branco – o último trecho a ser desbravado (décadas de 1950-1960).(Foto: Casa da Memória de Florianópolis)
Nesses quase trinta anos à frente desses estabelecimentos, Mauri viu a cidade passar por significativas alterações. Ele, que conhece como poucos o cotidiano da Ilha de Santa Catarina, mostra-se perplexo com as transformações ocorridas por aqui. Se, nos seus tempos de adolescente, esperava o motorista do ônibus da localidade em que residia buzinar em frente à sua casa, chamando-o para vir ao Centro estudar, hoje Mauri se assusta ao caminhar pelas ruas da sua Florianópolis e não conhecer praticamente mais ninguém.
Avenida Rio Branco em 2024. (Foto: Fernando Teixeira)
Atualmente, este manezinho, acostumado a pescarias, a se reunir com velhos amigos para um café ou a cuidar dos netos, está novamente fazendo o que mais gosta. Muito próximo de onde tudo começou, na velha e boa avenida Rio Branco, a Lisboeta voltou repaginada, e com ela a sempre calorosa, amável e indispensável recepção deste homem que, como poucos, sabe conquistar a amizade dos que têm a felicidade de conhecê-lo. Florianópolis agradece!
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Sobre o autor
Fernando Teixeira
Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFSC), mestre em Geociências e Doutor em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), natural de Florianópolis. Atualmente tem se dedicado à fotografia.
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