00:00
21° | Nublado

Floripa e o Remo: A emoção que era um passeio ao Centro, em outra época!
Por Fernando Teixeira

Regata internacional em comemoração ao cinquentenário do Clube Aldo Luz (Foto: Arquivo) **Clique para ampliar

Publicado em 28/10/2022

Quando ainda menino, os convites feitos por minha mãe para acompanhá-la ao Centro da cidade eram sempre aguardados com expectativa. Na verdade, aquilo era como fazer uma viagem a outro mundo. Mesmo que o objetivo fosse adquirir “fazenda” para suas costuras, na antiga loja do João Salum, talvez admirar alguma roupa nova, na Grutinha, ou mesmo dar uma passada rápida na Soberana para comprar as deliciosas balas “rocôco”, depois de ter feito um lanchinho na padaria Brasília, o que importava na verdade, para mim, era ver aquela movimentação intensa de pessoas circulando pela magnífica Praça XV ou pelas ruas que beiravam o antigo cais do porto, ou ainda, quem sabe, admirar casais apaixonados a namorar no parapeito do saudoso Miramar. 

Não obstante tudo isso, algo sempre me chamou muita atenção: presenciar aqueles moços num vaivém frenético, levando e trazendo das águas da baía sul seus “magrelos e lustrosos” barcos, bem diferentes daquelas robustas canoas cheias de cor que eu conhecia no distante Saco dos Limões. Aquilo me intrigava, e eu ficava a me perguntar: o que será isso? Então logo aprendi que se tratava de uma atividade esportiva, chamada “REMO”. A partir daí passei a acompanhar sua trajetória, até porque as regatas eram transmitidas pelas rádios “Diário da Manhã” e “Guarujá”, e eu as escutava na companhia de meu avô. Apesar dos muitos convites de amigos, nunca o pratiquei. Detestava acordar ainda na madrugada para ir remar. 

 

 


Mesmo local da foto 1 - agora com um terminal de passageiros e asfalto cobrindo o mar (Foto: Fernando Teixeira)

 

Mas, retornando ao assunto inicial, às chamadas da Dona Adélia, posso também afirmar que toda vez que o velho ônibus Ford 1950 ( e poucos), da Empresa Limoense, ligava seu potente motor lá pelas bandas do Armazém Vieira, indicando que estava prestes a iniciar minha incursão ao colorido e enigmático centro da cidade, logo eu pressentia uma diversão garantida. Eram muitas emoções!

As recordações me fazem, literalmente, sentir ainda o aroma do mar, dos peixes trazidos pelos pescadores para serem comercializados no Mercado Público, ou até mesmo ouvir os gritos de vendedores ambulantes ao desembarcar na Praça Fernando Machado, ponto final da fantástica aventura. O mar estava ali! O mar era ali! Tão encostado na Praça XV de Novembro, que em dias de vento Sul era possível ser sentido, em suaves gotículas, por aqueles que frequentavam seus bancos para ler um jornal, ou jogar conversa fora à sombra da velha figueira. Mal sabia eu que aqueles eram os últimos anos de minha vida em que poderia vir ao centro da cidade e contemplar o mar a bater em sua porta, a banhar a resistente muralha que o dificultava de encharcar as ruas que margeavam aquele sítio. 

 


Antiga sede do Clube Martineli (Foto: Fernando Teixeira)

 

Uma impactante ruptura do tecido urbano com a porção marítima que o complementava começava a tomar corpo no início da década de 1970 com a implantação do aterro da Baía Sul. Necessidades referendadas por planos urbanísticos fizeram com que a cidade se afastasse definitivamente da borda do mar, e atividades, antes visceralmente imbricadas ao local, fossem, aos poucos, perdendo seu sentido de pertencimento.

A atividade praticada pelos clubes de remo da capital foi sem dúvida uma das mais atingidas naquele momento, em função das alterações causadas pela implantação do aterro hidráulico nesse pedaço de Florianópolis. Relatos de pessoas ligadas a esse importante esporte náutico dão conta de que foi preciso um esforço monumental de seus praticantes para mantê-lo vivo e fazendo parte de nossa história. 

Dos três clubes existentes na cidade, apenas o Riachuelo não sofreu com problemas de continuidade, pois sua estrutura física encontrava-se fixada junto ao antigo estaleiro Arataca, na cabeceira insular da Ponte Hercílio Luz, área essa não atingida pelo aterro. Enquanto isso, Aldo Luz e Martinelli, com seus galpões situados entre o Miramar e o Forte Santa Bárbara, ficaram bem distantes das raias de treinamento, o que tornava complicada a prática do esporte por seus remadores.

 

 


Novos galpões dos clubes de remo - Baía Sul - cabeceira insular das pontes que ligam ao Continente (Foto: Fernando Teixeira)

 

Assim, passaram-se quatro longos anos, até que novos galpões fossem inaugurados e pudessem ser utilizados, abrigando definitivamente remadores e toda a estrutura material que envolve essa fantástica atividade esportiva. Localizadas entre as pontes Hercílio Luz, Colombo Salles e Pedro Ivo, as novas estruturas, construídas pelo poder público, foram fundamentais para a retomada da atividade. 

Uma coisa, porém, é certa: aquele envolvimento fantástico com o público, que no dia a dia acompanhava o vaivém de remadores a descer as rampas e escadas do cais, levando seus barcos à água no centro “frenético” da antiga Florianópolis, havia sido rompido de maneira abrupta e inimaginável. O remo passou a estar distante de seu público, mas ressurgiu. Hoje suas três centenárias agremiações vivem novos momentos, tendo muita história para ser revisitada, e contada. Mas isso é assunto para a próxima coluna! Até lá! 

 

Para receber notícias, clique AQUI e faça parte do Grupo de WHATS do Imagem da Ilha.

Gostou deste conteúdo? Compartilhe utilizando um dos ícones abaixo!
Pode ser no seu Face, Twitter ou WhatsApp!

Para mais notícias, clique AQUI


 


Sobre o autor

Fernando Teixeira

Formado em Arquitetura e Urbanismo (UFSC), mestre em Geociências e Doutor em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), natural de Florianópolis. Atualmente tem se dedicado à fotografia.


Ver outros artigos escritos?