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Elegia ao elogio parte II , por André Vasconcelos
Existem elogios obrigatórios... à enologia!

Elogios a Paul Bocuse, um dos criadores da Nouvelle Cuisin, que nos deixou em 2018. (Foto: Markus Kirchgessner)

Publicado em 25/01/2024

Esta semana voltamos com a segunda parte da crônica. Agora no contexto da enologia. 

Existem outros elogios obrigatórios! Como tomar Petrus 1990, e não elogiá-lo?

Independente de gostar ou não, não é aceitável para entendidos em vinho que algum cidadão possa não gostar de um rotulo avaliado com 100 pontos por Robert Parker e que custa perto de quatro mil euros.

Não tive a sorte, dinheiro ou oportunidade de experimentar essa safra, mas já degustei um Petrus, e não importa se agradou ou não o meu paladar, não sobra espaço para crítica, afinal, é um ícone!

Acho que meu paladar não está preparado para vinhos acima de cem euros, exagerando, mas elogiei cada gole do Petrus, principalmente pela capacidade de alguém produzir um vinho deste valor, e ter pessoas que vão aos céus só ao vê-lo... elogios providenciais e quase obrigatórios, mas não pagaria esse valor por uma garrafa com tantos elogios.

E não são poucos os vinhos com elogios garantidos, talvez por seus preços astronômicos, talvez por terem se tornado um objeto de desejo.

 Romanè Conti, Lafite Rothschild, d’Yquem, Cheval Blanc, Mouton-Rothschild, Hermitage La Chapelle, Haut Brion, e tantos outras eno-lendas com cada garrafa chegando a custar mais de cem mil euros dependendo da safra.

Como não elogiar uma garrafa dessas???

Tão difícil como não elogiar cozinheiros consagrados, alguns mais pela sua competência em marketing pessoal do que pelo talento para pilotar um fogão.

É quase um acinte criticar os laureados pela mídia, ainda mais os presentes no topo da lista da revista “Restaurant” que insiste em eleger os melhores do mundo, e mesmo para muitos de nós que nunca provamos sequer uma dessas cozinhas, o elogio a todas elas é obrigatório para ser considerado um bom gourmand.

Rogério Fasano comentou certa vez sobre sua visita ao The Fat Duck, a época o primeiro do mundo: “afinal de contas as pessoas vão ao Fat Duck para aplaudir, não para reclamar.”... o elogio é obrigatório.

Ele foi criticado por não elogiar e os críticos de plantão encaram isso como menosprezo a culinária moderna, um plebeu criticando o mundo de nobres cozinheiros de mídia.

"Sem liberdade de criticar, não existe elogio sincero." (Pierre Beaumarchais)

O mesmo restauranteur Rogério ao saber que o seu Fasano estava em 59º na lista da “Restaurant” nos idos anos 2010, comentou que estava feliz da vida e surpreso com a escolha, mesmo porque ele era dos poucos da lista que ainda cozinha em fogão.

Nessa mesma linha de pensamento, Paul Bocuse dizia que, no mundo de redes sociais e tecnologias ufanicas, para ser cozinheiro, tem que entender de medicina.

Elogios a Paul Bocuse, que nos deixou em 2018, um dos criadores da Nouvelle Cuisine, movimento que se caracteriza pela culinária elaborada em pouco tempo, com molhos mais leves e menores porções, apresentadas em forma refinada e decorativa.

Mesmo muito elogiado, em uma autocrítica, fala do movimento como uma criação das mídias e não uma revolução incrível, e o define simploriamente de “nada no prato e tudo na conta”, uma alusão as nano-porções e aos mega-preços.

Elogios a ele, eleito merecidamente o chef do século, hoje grande defensor da existência de uma só culinária: a boa.

Elogios aos que valorizam a autocrítica e críticas aos que promovem o autoelogio, que, para mim, é a pior forma de elogio.

"O mal de quase todos nós é que preferimos ser arruinados pelo elogio a ser salvos pela crítica. ( Norman Vincent ) 

Elegia, palavra usada no título deste texto, por definição é um poema triste, de luto.

Usei elegia por achar que o elogio usado inconseqüentemente também é lutuoso, pelo menos na visão deste cozinheiro, que pouco aprendeu com elogios rasgados, mas procura evoluir com cada crítica sincera.

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Sobre o autor

André Vasconcelos

Cozinheiro raiz e autodidata, hoje no comando de sua Cozinha Singular Eventos e d'O Vilarejo Hospedaria e Gastronomia, onde insumos e técnicas são a base de cardápios originais e exclusivos... e aprendiz de escritor também!


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