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“A dança” de Pablo Neruda e “A valsa” de Casimiro de Abreu: a palavra na coreografia do poema

'Bailarinas em Rosa' - Edgar Degas - Pintor francês impressionista (1834-1917) - Foto: Internet/ Reprodução **Clique para ampliar

Publicado em 27/10/2023

Nesta sexta-feira, 27, recebemos a nova colunista do Jornal Imagem da Ilha. Luzia Almeida é professora, escritora e mestra em Comunicação e, a partir de hoje, escreverá quinzenalmente sobre Literatura.

Aproveite a leitura!

 

Existem prazeres que estão além do entendimento humano e existem prazeres que estão no entendimento da palavra: no seu movimento e na sua alma como se fosse bailarina e coreógrafa. A palavra-bailarina convida-nos a uma dança na página de um livro onde a alegria é um mistério que não se pode desvendar: movimento da alma articulada. Mas, mesmo assim, não se perde a alegria na impossibilidade de desvendar o sol da música e o deleite das construções inéditas porque ainda permanece o questionamento: de onde procede tanta beleza poética?

Como o sol na aurora que timidamente nos assedia com a ideia de um novo dia, assim Pablo Neruda transforma nossa ideia de amor a partir de formas comparativas: “Não te amo como se fosses rosa de sal, topázio / ou flecha de cravos que propagam fogo: / te amo como se amam certas coisas obscuras, / secretamente, entre a sombra e a alma”. Nessa estrofe há uma indicação de lugar que fica “entre” e é secreto: existe um lugar maravilhoso e secreto de amor que apenas os poetas conseguem contemplá-lo. Esse lugar de amor permanece “entre a sombra e a alma” e torna nossa vida legitimada na conduta de um sentimento verdadeiro porque é sombra e porque é alma. O poema “A dança” de Pablo Neruda arrebata-nos para uma nova visão de amor com origem na palavra e a sua musicalidade faz-nos vencer a aparência de um “Eu te amo” de vitrine para uma expressão repleta de mistério e alegria que somente a palavra-bailarina pode conduzir.

“Te amo como a planta que não floresce e leva / dentro de si, oculta, a luz daquelas flores, / e graças a teu amor vive escuro em meu corpo / o apertado aroma que ascendeu da terra”. O verbo amar no poema de Neruda é incondicional, mas não é impossível já que as comparações fazem com que vivamos com ele esse aroma que ele sente na construção poética: quando ele diz “Te amo” também somos atingidos pela palavra na conjugação de um sentimento tão especial e tão comum que nos abraça e nos faz confessar essa realidade com a simplicidade. Mas, embora esse diálogo emotivo seja nosso e seja verdadeiro, na perspectiva de Neruda há a vitória da manifestação do amor que é real porque se eternizou no poema.

Então, só nos resta “A valsa” de Casimiro de Abreu: uma canção de amor que nos envolve no eterno labirinto do desencontro do amor com o objeto amado: “Tu, ontem, / na dança / Que cansa, / Voavas / Coas faces / Em rosas / Formosas / De vivo, / Lascivo / Carmim; / Na valsa, / Corrias, / Fugias, / Ardente, / Contente, / Tranquila, / Serena, / Sem pena / De mim!”. Percebe-se na conduta da palavra esse mistério também que sufoca todo aquele que não tem encontrado o eco do seu coração. A palavra-bailarina de Casimiro de Abreu assusta-nos com a dureza da indiferença amorosa porque o amor também tem as suas preferências e, muitas vezes, desencontra-se de nós na preferência de ... um poema do século XIX e que, mesmo no passado reflete seu caráter volitivo.

Na coreografia do poema, a palavra é a estrela e o sentimento. O poeta inaugura um motivo para a palavra que reflete a situação numa proposta aórtica. No poema há sempre música. Mas, na impossibilidade do eco teremos sempre a beleza da construção inédita da palavra porque a orquestra é o coração.

“E as breves / Falenas / Vão leves, / Serenas, / Em bando / Girando, / Valsando / Voando /  No ar!...”

 

 

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Sobre o autor

Luzia Almeida

Luzia Almeida é professora, escritora e mestra em Comunicação


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