00:00
21° | Nublado

Um brinde ao vinho chileno
Em almoço harmonizado, enólogo do grupo Ventisquero compartilhou informações sobre a vitinicultura chilena

Crédito: Reprodução

Publicado em 11/10/2019

Em setembro tive a oportunidade de conversar com Alejandro Galaz, enólogo do grupo Ventisquero por trás dos projetos Kalfu e Ramirana, braços “boutique” dessa importante vinícola chilena.  Num almoço harmonizado no restaurante Ostradamus, em Florianópolis, com alguns dos vinhos produzidos por ele, Alejandro compartilhou muito conhecimento e informações importantes sobre os caminhos da vitinicultura chilena.

Kalfu e Ramirana têm um ponto em comum, que é a busca por vinhos mais frescos, de terroirs mais frios e que vêm de acordo com o movimento mundial dos consumidores em buscar esse estilo de vinhos, com mais fruta, acidez e menos madeira. O grupo possui vinhas próprias para o projeto Kalfu, nas regiões de Casablanca e Leyda, há poucos quilômetros do oceano Pacífico, que são influenciadas pela corrente de Humboldt, vinda do sul esfriando toda a costa, com águas que chegam a 8°C de temperatura, criando, assim, uma condição climática única até cerca de 25km terra adentro. E possui vinhas próprias também para o projeto Ramirana, em Maipo, tradicional região do Vale Central.

Provamos exemplares da Kalfu, que significa “azul” na língua Mapuche, de Sauvignon Blanc e Pinot Noir, de ambas regiões comparando os estilos e as influências de clima e solo. Galaz explicou sobre a proximidade do Pacífico dos terraços de vinhedos de Leyda para os rótulos Gran Reserva. Eles estão distantes entre 6 e 8 quilômetros do mar e possuem um solo aluvial com granito e quartzo. Essa influência traz mais vibração de acidez tanto nos tintos como nos brancos, aromas mais herbáceos como grama cortada, aspargos e ají verde no Sauvignon Blanc, e no Pinot trouxe mais tensão que permitiu a utilização de barricas novas e maior extração, sendo um vinho mais firme e complexo.

Já Casablanca, ainda em região costeira, porém um pouco mais distante – de 15km a 25km do mar – mostra vinhos mais fáceis, leves, com o branco mais cítrico e com frutas tropicais, e o Pinot mais leve, com frutas vermelhas e pronto para beber. A linha “Reserva” é produzida com as uvas dessa região.

Conversamos bastante sobre a exploração dos limites mais extremos do Chile, como após a busca pelo litoral, agora os produtores estão indo atrás dos limites norte e sul, como fez a Ventisquero com o projeto Tara, no Atacama. Galaz lembrou que esse projeto foi responsável por redesenhar o mapa das regiões produtoras do Chile e acha ainda que o ponto crucial é buscar os vinhedos de montanha aproveitando o fato de que o Chile é um país cheio de vulcões, e que alguns dos grandes vinhos do mundo têm origem nesses solos. Mais uma inovação está sendo feita no campo, com a procura de novas castas, como Chenin Blanc, por exemplo, e com o trabalho de selecionar a levedura nativa do vinhedo e reproduzir no laboratório para ter uma levedura selecionada, mas indígena.

Terminamos o almoço com alguns vinhos do projeto Ramirana, nome ligado à tradição dos cavalos crioulos do interior do Chile. Vinhos tintos com castas que usualmente se espera muita estrutura, madeira e corpo, mas que também foca no frescor e na elegância, inclusive no seu ícone do vinhedo Trinidad do Maipo num canto que ainda recebe uma leve influência das brisas do Pacífico. Mesmo com um assemblage inusitado de Syrah, Cabernet Sauvignon e Carménère que passa em barricas, é um vinho elegante, com ótima acidez, harmonizando bem com os taninos maduros e que permitem uma linda evolução em garrafa por mais alguns anos.

Independente do rótulo degustado, percebi uma característica muito marcante do terroir, das influências de clima, solo, homem e uva sendo respeitadas e transmitidas sem muita intervenção. Alejandro sabe muito bem interpretar essas características de forma positiva e que dá identidade aos projetos. É um cara aberto ao mercado, que usa sua vasta experiência para pesquisar e conhecer outros vinhos e outras regiões, e entender o que o consumidor quer, mas sem perder a essência.  


Sobre o autor

Eduardo Machado Araujo

Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers


Ver outros artigos escritos?