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O fruto proibido

Foto: Reprodução

Publicado em 02/08/2016

Diz a Bíblia que Adão e Eva foram expulsos do Paraíso por terem comido o fruto da Árvore da Ciência, da Árvore “do conhecimento do bem e do mal”. Talvez a culpa tenha sido da serpente que resolveu colocar um pouco de pimenta na monótona relação; ou da Eva que pensou em começar um regime à base da fruta na primeira dieta da história; ou até de Adão que, sem futebol e sem cerveja, andava depressivo e Eva foi à procura de um pecado para irritar o marido.

Como poderiam imaginar que uma simples maçã iria fazer tanto estrago? Esta fruta é tão antiga quanto a história da humanidade: pesquisadores dizem que ela existe desde o final da era glacial, há mais de vinte e cinco mil anos, e é originária de algum lugar próximo ao Cáucaso, um pouco mais ao norte de onde julgam ter sido o Jardim do Éden. De lá ela se espalhou pelo mundo permeando inúmeras estórias, lendas e mitos em civilizações distintas, muitas vezes sendo sua base alimentar. Estudos apontam que a macieira foi a primeira árvore cultivada pelo ser humano e já fazia parte da alimentação do povo de Jericó, a cidade mais antiga do mundo.

Alexandre, o Grande, rei da Macedônia, trouxe de suas viagens ao Oriente, mudas de uma espécie anã, resistente ao inverno, e a partir da Grécia do século IV a.C., espalhou-se por toda a Europa tornando-se um dos principais alimentos da época, lembrando o tomate e a batata ainda não eram conhecidos. Quando Colombo chegou à América, de onde vieram os tomates e as batatas, vikings e piratas já haviam trazido macieiras para Groenlândia e Canadá, e já era um fruto permitido no Novo Mundo. Médicos do século XVI indicavam maçãs cozidas como remédio e, no século seguinte, os camponeses europeus produziam a sidra, um vinho à base de maçãs.

E sendo tão antiga e tão presente em todo o mundo, nada mais justo do que fazer parte da culinária típica de vários povos. Na Europa Central, a maçã é o purê que guarnece muitas carnes gordas. Na Holanda, o médico Maximilian Bicher-Brenner ralou e secou maçãs que, misturadas a oleaginosas e flocos de arroz, fez o müesli, o pai de todas as granolas. Na Alemanha, o apfelstrudel é mais conhecido que a bandeira nacional! A American Apple Pie, a torta de maçã que não foi inventada pelos americanos, é o maior ícone daquela gastronomia sem graça, a ponto de ter um ditado popular que diz: “tão americano quanto uma torta de maçã”! Mas, na minha opinião de cozinheiro, de quem aprecia o simples e bem feito, o sabor real de cada alimento, a combinação perfeita de acidez/doçura/gordura, a francesinha Tarte Tatin é a campeã entre as tortas de maçãs.

Sua receita, diz a lenda, surgiu de um erro. Stephanie Tatin, uma das irmãs que comandava o Hotel Tatin, no Vale do Loire, de tão atarefada levou ao forno as maçãs às metades, intercaladas com manteiga e açúcar, esquecendo da sua base. Quando deu por si, cobriu a forma com a massa e levou de volta ao forno! Servida quente e caramelada, é a prova definitiva que em gastronomia o menos é mais, e que um erro pode ser fatal, mas pode ser um grande acerto. Eva errou e nos demos mal... Stephanie errou e nos demos bem. Essas são algumas das muitas lendas do fruto proibido!