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A região do Jura

(Foto: Reprodução)

Publicado em 29/09/2017

Há algum tempo quero falar por aqui sobre os vinhos do Jura, uma obscura região francesa que produz uma diversidade enorme de vinhos e uvas pouco comuns, mas que há cerca de três anos ganhou fama e se tornou “cool” nas rodas de sommeliers e enófilos pelo mundo. Essa onda chegou ao Brasil no ano passado e é comum ver o pessoal atrás dos diferentes vinhos do Jura.

Após conseguir visitar a região fiquei empolgado pela sua beleza, rusticidade e pela filosofia que impera no local que é produzir vinhos, queijos – o famoso Comté é produzido na região – e outros produtos agrícolas de maneira sustentável, orgânica e com princípios biodinâmicos.  O Jura já foi uma região importante para o vinho francês, mas uma sucessão de pragas, guerras e o surgimento de novas rotas para regiões emergentes fez a produção local se virar para outras culturas.

Para se ter uma ideia, a Apelação de Origem Protegida “Arbois” é a primeira da França criada em 1936 e Arbois é a principal vila dentro do Jura, onde você pode visitar um grande número de produtores que se acumulam pelas ruas centrais. Espremida entre a Borgonha e os Alpes Suíços, o Jura possui outras localidades que dão nome aos seus vinhos, como a minúscula Pupillin no alto da montanha ao lado de Arbois e a famosa e belíssima vila do Château Chalon com seus vinhedos dedicados a produzir o Vin Jaune, incrustados nas colinas abaixo das casas e construções com séculos de história.

Essa região pitoresca, ainda hoje um tanto isolada, foi capaz de criar vinhos de estilos muito diferentes com as uvas locais. A mais plantada é a Chardonnay, tem também Pinot Noir, produzindo um estilo mais leve que na Borgonha, as tintas Poulsard (Ploussard) mais delicada e floral e a Trousseau (Bastardo em Portugal) mais terrosa e encorpada. Mas, o grande diferencial é a presença da Savagnin - variedade tardia muito bem adaptada ao local -, que produz vinhos comuns num blend com Chardonnay, mas também é a uva para a produção do Vin Jaune. Bom, é ai que o Jura fica mais interessante!

Além dos clássicos brancos, tintos, rosés e o Crémant do Jura a região produz vinhos oxidativos de longo envelhecimento e vinhos doces de maneiras bem peculiares. O Vin Jaune, literalmente “Vinho Amarelo” é a estrela local, produzido 100% com Savagnin. As uvas são colhidas tardiamente com um potencial alcoólico mais alto e o mosto é fermentado lentamente e depois transferido para barricas antigas de 228l, com um pequeno espaço de ar que é aumentado pela evaporação.

Esse espaço permite a criação de um véu ou "voile" de leveduras, como a "flor" no Jerez, protegendo o vinho parcialmente da oxidação. O aparecimento por completo desse véu dura até três anos e o vinho deve ser envelhecido por no mínimo seis, desenvolvendo características oxidativas únicas. Após esse tempo de evaporação de cada litro original sobraram 620 ml de vinho, por isso o Vin Jaune é engarrafado na tradicional garrafa de 620ml chamada "Clavelin".

O Jura também produz um vinho doce delicioso chamado Vin de Paille. O nome é dado devido ao método de produção as uvas, que são deixadas secar por cerca de seis semanas e tradicionalmente isso era feito em esteiras de palha. A fermentação é lenta e o envelhecimento é longo produzindo um vinho doce de coloração âmbar e muito aromático.

Talvez o mais curioso vinho local seja o Macvin, infelizmente não é um vinho para se pedir na lanchonete mais próxima, mas uma junção das palavras Marc (destilado de tudo que sobra da prensa das uvas) e Vin onde o mosto levemente fermentado, ainda com muito açúcar, recebe a adição de Marc do mesmo produtor. O produto final é mais alcoólico e doce.

A dica é beber um Vin Jaune com os queijos locais, pratos cremosos com cogumelos e a famosa Tartiflette!


Sobre o autor

Eduardo Machado Araujo

Certified Sommelier - Court of Master Sommeliers


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